Naturalmente, só uma parte pôde ser publicada na reportagem. Uso, então, o espaço aqui para publicar a íntegra da entrevista gentilmente concedida por Araujo por email.
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CC. Poderia falar um pouco de sua linha de pesquisa para um público não especializado?
AA. Eu trabalho em uma área da arqueologia que se chama "Geoarqueologia". É uma aplicação das Ciências da Terra (Geologia, Geomorfologia) a assuntos arqueológicos, que permite que entendamos melhor os processos naturais que afetaram inicialmente as populações humanas, enquanto estavam vivas e operantes, e que depois afetam os vestígios materiais deixados por essas populações, que nós hoje chamamos de materiais arqueológicos (que podem ser desde lascas de pedra até cidades inteiras).
CC. Como a comunidade científica recebeu seu trabalho sobre a influência da bioturbação no trabalho arqueológico?
AA. O trabalho foi bem recebido, uma vez que foi publicado em uma das revistas mais bem conceituadas na área, chamada "Geoarchaeology". Não é facil publicar um artigo em revista internacional, porque os revisores costumam ser implacáveis. Nosso artigo sobre bioturbação foi inovador no sentido de que fizemos uma observação controlada das atividades de um animal que é bastante poderoso em termos de escavação, que é o tatu. O artigo tem um bom índice de citação, até hoje, apesar de ter sido publicado há mais de dez anos. Portanto, levando em conta essas informações, eu diria que a aceitação foi boa.
CC. V. Sra. recebeu com bom humor o prêmio IgNobel (assim como vários outros agraciados que recentemente até participam da cerimônia de entrega). Inclusive o menciona em seu currículo lattes. A premiação ajudou de alguma forma a sua pesquisa? Trouxe uma visibilidade positiva?
AA. A premiação do IgNobel foi uma coisa muito bacana, que eu aceitei de bom grado. Acho que a ciência é algo que deve ser levada a sério sem que seja sisuda e mal-humorada. O pessoal do IgNobel é muito respeitoso, e na verdade eles perguntam ao candidato se ele aceita o prêmio. Eu achei ótimo, e consultei meu colega, José Carlos Marcelino, que também concordou. Foi uma pena eu não ter podido ir à premiação, que parece ser um espetáculo, com vários ganhadores do Prêmio Nobel participando. Acho que aceitar o prêmio IgNobel é entender que você ajuda a disseminar a ciência como uma coisa interessante. Como eles mesmos dizem, é algo que "primeiro faz rir, e depois faz pensar". Um ótimo exemplo é uma outra premiação do IgNobel de 2008, o mesmo ano em que eu entrei para esse seleto clube, onde os pesquisadores trabalharam dentro de uma boate de strip-tease, e descobriram que as dançarinas ganhavam mais gorjeta quando estavam no período fértil. Muito engraçado, mas ao mesmo tempo faz pensar um bocado, não? Será que somos tão racionais assim? Será que somos sujeitos à ação de feromônios de uma maneira muito mais forte do que imaginamos? Será que existe livre-arbítrio? Ou seja, uma coisa engraçada pode levar você aos mais altos questionamentos filosóficos.
Com relação á visibilidade, não creio que o IgNobel tenha tido nenhum impacto perceptivel na minha carreira. Não acho que eu tenha ganhado ou perdido nenhuma oportunidade por conta do prêmio. Considero mais como parte da minha obrigação enquanto acadêmico, de divulgar para um público mais amplo o que eu faço.
AA. Não há premiações na área de Arqueologia que tenham o impacto de uma Medalha Fields ou um Nobel, ou coisas assim, portanto não almejo nenhuma premiação, mas se houvesse algo, creio que na forma de auxílio à pesquisa seria ótimo. Na verdade, já tenho financiamento da FAPESP para pesquisar sobre as populações mais antigas do Estado de São Paulo, e uma bolsa de Produtividade em Pesquisa do CNPq, levando em conta minha carreira acadêmica, então me sinto realmente premiado.
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Este trabalho foi produzido sob financiamento da Fapesp (Bolsa Mídia Ciência), sob supervisão da Profa. Dra. Simone Pallone e Dra. Katlin Massirer.
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