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quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O Brasil precisa de um apagão científico como o do IINN-ELS

Antes de mais nada, dois avisos necessários: respeito o trabalho do jornalista Herton Escobar, a quem não conheço pessoalmente (só assisti a uma palestra dele em um evento sobre Origem da Vida na USP e acompanho seus textos no Estadão e ocasionalmente comento suas postagens no blogue Imagine Só!) e respeito o trabalho do Prof. Dr. Miguel Nicolelis, a quem também não conheço pessoalmente (só assisti a uma palestra dele no lançamento de Muito Além de Nosso Eu em Belo Horizonte e converso por meio do twitter).

O Estadão publicou uma matéria a respeito da produção científica do Instituto Internacional de Neurociências de Natal - Edmond e Lily Safra - IINN-ELS após a saída de pesquisadores em meados de 2011 por uma série de divergências. Um ano e meio depois ainda há disputa entre o que podemos chamar de dissidentes e a equipe de Nicolelis, por exemplo, em relação a alguns equipamentos.

Mas, palavras da reportagem do jornal paulista: "Após saída de boa parte da equipe, há 18 meses, IINN nada produziu, mas neurocientista continua recebendo volumosas verbas do governo." e "Desde então, o IINN não publicou nenhum trabalho científico novo." Para o Estadão, isso seria o "apagão científico".

Em resposta, Nicolelis divulgou no sítio web do IINN-ELS lista dos artigos publicados entre 2011 e 2012.

O Estadão voltou à carga, dizendo que os artigos são referentes aos trabalhos pré-racha.

Bem ,o fato é que o IINN-ELS *publicou* artigo novo. Sim, são referentes a trabalhos pré-racha. Porém, o que era de se esperar? Há um lapso de tempo provocado pelo processo de submissão e análise de manuscritos até a publicação - só entre a recepção e aceite, em uma Nature, o tempo médio é de cerca de 200 dias, mas pode passar de 20 meses para outras publicações.

Considere então o cenário: há um racha, chegam novos integrantes, que começam a fazer seus trabalhos, obtêm seus resultados, preparam seus manuscritos, submetem, fazem as correções e finalmente é publicado (isso sem contar eventuais rejeições dos manuscritos). Não é mesmo de se esperar que trabalhos iniciados pós-racha sejam publicados em revistas indexadas antes de 2012 - devem começar a ser publicados a partir de 2013.

Assim, o melhor indicador da produção pós-racha são os resumos em congressos, são 16 no período: 10 em congressos internacionais, 6 em nacionais. Isso em 18 meses para uma equipa de 6 pesquisadores e 3 pós-graduandos: 1,18 resumo por integrante-ano.

Sério, isso é apagão onde? Bom seria se tivéssemos esse índice de produtividade em boa parte dos laboratórios e institutos de ciências - públicos ou privados.

Só posso expressar minha perplexidade com a má vontade do Estadão (aumentada justamente pelo meu respeito ao trabalho de Herton Escobar). Ok, o Dr. Nicolelis não quis responder às perguntas feitas e para algumas seria muito interessante que houvesse uma resposta (por exemplo, a Raytheon está bloqueando a publicação dos dados sobre pernas robóticas controladas a distância com ondas cerebrais de uma macaca na esteira? - isso tem implicações bastante sérias); no entanto, não é dizendo mentiras como "Nicolelis usa trabalhos antigos para mostrar nova produção de instituto" que se vai resolver a questão.

Upideite(19/dez/2012): Profa. Dra. Ângela Paiva, reitora da UFRN, fala sobre o rompimento entre os professores da universidade e a equipe de Nicolelis.
Upideite(19/dez/2012): Vale muito a pena ler também o texto de Bernardo Esteves para a Revista Piauí de um ano atrás sobre a "mitose" dos grupos e os planos de Nicolelis.
Upideite(21/dez/2012): Herton Escobar responde a algumas questões que fiz sobre o desenvolvimento da reportagem.
Upideite(14/fev/2013): Herton Escobar volta à carga. Segundo o jornalista, o recente trabalho sobre processamento pelo córtex tátil de ratos de sinais infravermelhos captados por sensores artificiais não teria sido produzido em Natal, a despeito da filiação dos autores indicada no artigo. Nicolelis responde que daqui a duas semanas sairá artigo na Nature com resultados de trabalhos em Duke e em Natal.
Upideite(14/fev/2013) Segundo Miguel Nicolelis, essas acusações levaram à perda de doação de R$ 300 mil ao programa de pré-natal de alto risco.

2 comentários:

André R.D.Baptista disse...

Por acaso teria sido este o motivo do racha: O Prof. Nicolelis tentou fazer o pessoal trabalhar pra valer, impondo um padrão anglo—saxão, sem considerar os "usos e costumes" locais?

none disse...

Salve, André,

Não tenho conhecimento suficiente para tentar um chute mais informado. Talvez um dia as partes queiram falar sobre o assunto. Até lá, tudo será só especulação. (Ok, dá pra descartar algumas possibilidades - como um alienígena Vogon ter ameaçado destruir a Terra se continuassem a parceria.)

Valeu pela visita e comentários.

[]s,

Roberto Takata

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