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segunda-feira, 17 de novembro de 2014

A quem interessa o catastrofismo categórico irrevogável?

Folha 10/nov/2014 "Mas talvez agora já seja tarde demais: há fortes sinais de falência do sistema amazônico, que incui a floresta e sua influência sobre o clima continental."

Opção 5-11/out/2014 "É justamente pela força da ciência que ele dá a notícia que não queria: na prática o Cerrado já está extinto como bioma."

Não duvido que tais sentenças tenham sido dadas da mais boa fé. Mas, de um lado, a ecologia de biomas é um tema complexo demais para uma afirmação do tipo: "está extinto" ou "falência" seja dada de modo categórico. Sim, podemos falar com alta dose de certeza de que o bioma da flora de Dicroidium está extinta. Mas temos dificuldades de dizer até se  alguma espécie recente está extinta - temos um parâmetro de 50 anos sem registro no ambiente selvagem a despeito de coletas sistemáticas, mas há vários casos de organismos que foram encontrados depois de declarados extintos.

A situação de um bioma inteiro é muito mais complicada. Existem espécies-chave? Funções-chave? Que nível mínimo populacional deve ser alcançado? Que nível mínimo dos parâmetros funcionais são considerados? Qual o grau de resiliência e de redundância? O quão generalizável são os parâmetros de um ambiente para os demais? O que se estabelece para certos fragmentos é extrapolável para uma área maior? Não são elementos fáceis de se determinar - até por isso há intensos estudos de larga escala e longo curso agora na Amazônia como a capitaneada por Thomas Lovejoy.

De outro, há uma implicação econômica e ética complicada.

Uma coisa é o alerta de que um ambiente, formação vegetal, paisagem natural, ecossistema, bioma corre sérios riscos. Isso envida o *aumento* dos esforços conservacionistas. Outra é dizer que tais áreas estão condenadas.

Declarar um bioma extinto ou além da possibilidade de salvação implica que a continuidade de quaisquer esforços atuais são inúteis, salvo para mercadores da falsa esperança. Melhor aplicar os recursos em outras áreas. E, fora alguma conservação de relicto na forma de museu natural, seria melhor derrubar o que resta para aproveitar melhor o espaço.

A quem interessa, então, o discurso catastrofista categórico irrevogável em relação ao destino de um bioma? Ainda mais quando os indícios em que se baseiam tais declarações estão longe de estar além de qualquer dúvida razoável.

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