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quinta-feira, 9 de abril de 2020

Especulando: Sistema Nacional de Divulgação Científica

Tanto quanto sei (e posso estar errado em relação a isso - fiquem à vontade para me corrigir nos comentários), não existe uma lei única estruturando o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia; mas sua existência é reconhecida inclusive em documentos legais (às vezes mencionada como Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação).

Por exemplo, o sumário executivo da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2016-2022, publicado em 2018 pelo então MCTI, apresenta o seguinte arcabouço do SNCTI.


Além dos organismos e instituições governamentais e não-governamentais, as regulações, leis e normativas legais e institucionais, além do ethos e da cultura burocrática, acadêmica e científica, compõem, dão forma e moldam o sistema e lhe ditam o funcionamento. Sua construção foi paulatina, ocorrendo ao longo de séculos - e, principalmente, ao longo das últimas seis décadas.* (E nos últimos tempos vêm enfrentando um período turbulento, com ações ostensivas por parte dos governos locais e federal para seus desmonte e descaracterização.)

Creio que estejamos vivenciando algo similar no campo da divulgação científica. Uma nucleação do que pode vir a ser um Sistema Nacional de Divulgação Científica ou de Comunicação Pública da Ciência. Diversos componentes essenciais já estão postos sobre a mesa.

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Instituições
Em termos de atores institucionais temos o Departamento de Difusão e Popularização da Ciência e Tecnologia, no MCTIC, criado em 2004; a própria SBPC, diversas associações e iniciativas de congregação de comunicadores de ciência (a Rede Brasileira de Jornalistas e Comunicadores de Ciência - que simbolicamente herda a tocha da finada Sociedade Brasileira de Jornalismo Científico; a Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência, algumas regionais como a Rede Mineira de Comunicação Científica, alguns sem vínculo com instituições de pesquisa como o Science Vlogs Brasil e a Resistência Científica; e outras). E também o INCT-Comunicação Pública da Ciência e Tencologia. Algumas instituições como a UFMG, têm unidades específicas, no caso da Diretoria de Divulgação Científica, para coordenar as ações e políticas na área.

Veículos, ações e divulgadores
Há um sem número de veículos de divulgação científica institucionais, comerciais e pessoais/independentes: ComCiência, Ciência e Cultura, SciAm Brasil, Superinteressante, Galileu, seções de ciência em jornais e revistas de notícias em geral, blogs como o Blogs de Ciência da Unicamp e o Divulga Ciência da UFABC, podcasts, canais no Youtube, perfis em mídias sociais, etc. A parte de assessoria de imprensa de instituições de ensino e pesquisa, e também de jornalismo e de agências de notícias dessas mesmas instituições; além das ações de extensão e festivais. Há também iniciativas privadas como a Agência Bori. Enfim, há toda uma comunidade ativa de divulgadores das ciências atuando em conjunto ou sozinho, com ou sem vínculo institucional, trabalhando pra empresas ou atuando por conta própria.

Fomento e incentivo
Outra iniciativa privada, o Instituto Serrapilheira também se destaca como um importante ator, com seus editais de apoio à divulgação científica e sua política de estruturar o setor. O fomento também ocorre via editais do CNPq - como os de apoio a ações da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia -, Capes, e programas de bolsas como o Mídia Ciência da Fapesp.

Há também as premiações e reconhecimentos. Como o caso do Prêmio José Reis.

Capacitação
A bolsa Mídia Ciência é condicionada à participação em cursos de formação em Jornalismo Científico (ou disciplinas equivalentes em cursos de graduação em Jornalismo) ou Divulgação Científica. Cursos de especialização também se constituem parte desse sistema que se insinua, como o do Labjor, Museu da Vida/Fiocruz, LAbI... Há também cursos de treinamento em veículos como o da Folha de S. Paulo. Além de inúmeras disciplinas em cursos de graduação e pós-graduação e cursos livres.

Pesquisa
Muitos dos cursos - de especialização e disciplinas de graduação e pós - são vinculados a grupos de pesquisa em Divulgação Científica (casos do Labjor e da Fiocruz, p.e.). Os pesquisadores formam outra frente de atores no incipiente sistema.

Regulação
E, finalmente, há alguma regulamentação, dispersa em inúmeras leis e normativas: como o decreto que cria a Semana Nacional da Ciência e Tecnologia, as normas que estipulam a necessidade de atividades de divulgação por parte dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) e dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs).

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À medida em que esses diversos elementos forem se integrando - como por meio do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação para Popularização e Divulgação da Ciência e Tecnologia - poderemos ter um Sistema Nacional de Divulgação Científica/Comunicação Pública da Ciência completamente operacional. Mas os prazos das metas do Plano de Ação parecem atrasadas: escalonadas para serem completadas até 2022, muitas previstas para estar operantes este ano (e mesmo em anos anteriores) ainda não foram alcançadas. Por exemplo, dentro do eixo temático 1: "Gestão da Política Pública de Popularização da Ciência e Tecnologia" na iniciativa 1 "Apoio à gestão da política" e objetivo "Consolidar  a  política  de  popularização  e  divulgação  da  ciência  como  Política  de  Estado  e  estabelecer mecanismos permanentes de consulta pública, buscando a plena consecução de seus objetivos de alcance popular", subobjetivo "Instituir instância consultiva para consolidação da política pública", a meta "Até 2018, instituir instância consultiva para apoio à formulação, ao aprimoramento, ao  acompanhamento  e  à  avaliação  da  política  pública  de  popularização  da  ciência  do  governo federal" não foi alcançada dois anos depois. De fato, desde 2019, a participação popular em diversas instâncias consultivas e decisórias do governo federal e em muitos governos locais vem sendo reduzida.

Que o entrave atual - e mesmo o recuo - possa ser revertido. Mas, assim como ocorrido com o SNCT(I), provável que a maturação de um SNDC/CPCT leve um booooom tempo ainda.

Upideite (09.abr.2020): Esboço de elementos de um Sistema Nacional de Divulgação Cientítica

*Upideite (09.abr.2020): Pirró e Longo & Derenusson (2009) dividem a constituição do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia em 4 grandes períodos:
1o período (pré-1929): nucleação aleatória - inexistência de políticas e estratégias governamentais de C&T.
1929-1950: transição
2o período (1950-1980): nucleação programada - criação deliberada de componentes necessários para a criação do SNCT;
3o período (1980-2000): crescimento e interação - sistema delineada, mas ainda com baixa articulação entre os componentes do sistema;
4o período (pós-2000): amadurecimento - formulação de políticas e estratégias de articulação dos componentes.

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