Lives de Ciência

Veja calendário das lives de ciência.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

The Greatest Show on Earth: Resultado do sorteio

Bê Neviani é a ganhadora do sorteio do exemplar do "The Greatest Show on Earth" de Richard Dawkins. Ela já foi comunicada por email e o livro será enviado, sem nenhum ônus, por correio ao endereço postal indicado.

Em um pequeno balanço deste pouco mais de um ano de Gene Repórter - na verdade, desde setembro de 2009, quando as visitas começaram a ser contabilizadas, foram: 4.839 visitas únicas, em um total de 8.119 visualizações de páginas.

As 10 páginas mais visitadas foram:
  1. Dos emails roubados dos cientistas do IPCC. 602 visitas, vindas principalmente de um link no blogue Laboratório da Folha Online.
  2. Gene Repórter Ano 2. 534 visitas, principalmente do orkut.
  3. Plágio? 351 visitas, vindas principalmente do Semciência de Kinouchi.
  4. Aquecimento global (parte 1 de 3). 269 visitas, encaminhadas principalmente pelo Google.
  5. A origem 150 - parte 1 de 7. 227 visitas, principalmente do twitter.
  6. Clipping e clipes do euclipo. 205 visitas, originadas principalmente pela Ciência Hoje Online.
  7. Aquecimento global (parte 2 de 3). 179 visitas, vindas principalmente do Google.
  8. Belo e estranho mundo. 162 visitas, do orkut principalmente.
  9. Jogo dos erros. 161 visitas, principalmente do orkut.
  10. Aquecimento global (parte 3 de 3). 147 visitas, principalmente do Google.
As principais fontes de visitação foram sítios que se referiam a postagens do GR. Os principais são: Google, twitter, Scienceblogs Brasil, Laboratório da Folha (mas praticamente para uma única postagem), orkut, Blogger, Semciência, Ciência na Mídia da Tati Nahas, Blog do Luis Nassif (praticamente apenas para a postagem sobre a visita de Buzz Aldrin ao Brasil) e Ciência Hoje Online (praticamente apenas para uma única postagem).

Como a maior parte da visitação ao GR - mais da metade - depende da referência de outros blogues e sítios web, agradeço a todos que indicam alguma postagem daqui.

Aproveito para agradecer ainda aos 37 participantes da promoção e aos visitantes - poucos os fiéis, mas altamente qualificados. A estes e a todos os mais meus votos de um ótimo 2010.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 10

Em 1965, Edward K. Weaver e Eldred Black, baseados no trabalho de mestrado de Black, publicaram um artigo em que estudavam a correlação entre leitura de textos de ficção científica e o desenvolvimento do pensamento científico. Não encontraram nenhuma diferença significativa entre os leitores de FC e os de literatura não-FC.

Em 1977, Albert I. Berger publicou um estudo socioeconômico de fãs de FC. Entre outros resultados, obteve que (de 282 respondentes): 77 liam regularmente revistas científicas, 109 de modo irregular, 65 raramente, 27 nunca e 4 não responderam. Infelizmente não há dados disponíveis entre os que não são fãs de FC para comparar.

O sociólogo William Sims Bainbridge, em trabalho publicado em 1982, analisou a influência da FC sobre a atitude em relação à tecnologia. Ler livros ou assistir a filmes e séries de FC estava associado a uma maior probabilidade de apoiar a exploração espacial, porém não estava associado ao apoio a outras conquistas tecnocientíficas.

Em 2001, na pesquisa "Science and Engineering Indicators", foi feito um levantamento dos hábitos de leitura de FC entre os americanos adultos e o interesse em ciências. Esses dados estão sumarizados na tabela abaixo (Tabela 1).

Tabela 1. Leitura de FC por adultos americanos e interesse em ciências. Fonte: NSB 2002.

Há uma correlação entre o maior interesse em ciências e a leitura de FC, embora fraca. (Enquanto 30% do público em geral leiam FC; entre os que têm interesse por ciências, o número de leitores chega a 37%.) A relação de causa e efeito, claro, não é revelada por isso - a leitura de FC desperta interesse por ciências? Ou o interesse por ciências leva à leitura de FC? (As duas hipóteses são plausíveis e não são mutuamente excludentes.)

Referências
Bainbridge, W.S. 1982 - The Impact of Science Fiction on Attitudes Toward Technology. In E.M. Emme, ed. Science Fiction and Space Futures: Past and Present. San Diego, CA: Univelt. apud Hacker, B.C. 1984. Review [sem título]. Technology and Culture 25(3): 690-1. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/3104239
Berger, A.I. 1977 - Science-Fiction Fans in Socio-Economic Perspective: Factors in the Social Consciousness of a Genre. Science Fiction Studies 4(3): 232-46. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/4239132
National Science Board 2002 - Science and Engineering Indicators. Disponível em: http://www.nsf.gov/statistics/seind02/
Weaver, E.K. & Black, E. 1965 - The relationship of science fiction reading to reasoning abilities. Science Education 49(3): 293-6. Disponível em: http://www3.interscience.wiley.com/journal/112761993/abstract

domingo, 27 de dezembro de 2009

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 9

Não são dados diretamente comparáveis, mas podem dar um pouco mais de base às argumentações.

Um conjunto é de Kirby 2003a que mostra a evolução de número de filmes que usam consultoria científica na elaboração de seus roteiros. (Tabela 1.)

O outro conjunto é do "Science and Engineering Indicators" da National Science FoundationBoard que mostra a evolução da média das respostas corretas sobre temas científicos por residentes americanos. (Figura 1.)

Figura 1. Evolução do conhecimento científico entre os americanos. Fonte: NSB 2008.

Há várias interpretações possíveis - inclusive interpretações contraditórias - se nos basearmos unicamente nesses dados. Certamente há uma série de fatores afetando a questão da evolução do conhecimento público sobre ciências - investimento em educação, p.e.

Eu tendo a interpretar isso como a relativa desimportância da consultoria científica nos produtos culturais em relação à compreensão pública de ciências. À primeira vista isso pode soar como paradoxal no papel de *desinformação* atribuído a esses produtos culturais. Porém, se tivermos em mente o papel assimétrico da informação errônea em relação à informação correta (ou melhor dizendo, correta como considerada pela ciência contemporânea), o paradoxo se desfaz no nascedouro: o impacto negativo de uma informação errada é muito maior do que o impacto positivo de uma informação correta ou o impacto neutro de uma informação inexistente. Um conceito errado, uma vez formado, é muito difícil de se desfazer. (E ainda pode atrapalhar a formação de outros conceitos como demonstram os estudos já comentados na série: aqui, aqui e aqui.)

Ou como diz Kirby em outro trabalho (também de 2003b sobre consultoria científica em filmes): "By questioning the nature of fictional 'accuracy, ' I demonstrate that the scientific community’s focus on 'scientific accuracy' in fiction is flawed. Fictional film naturalizes both 'accurate' and 'inaccurate' science by presenting both as 'natural' via a perceptually realistic framework." O impacto final é apenas (ou principalmente) de legitimar *também* a desinformação. A separação do que é certo e do que é errado só é possível se o sujeito tem previamente o conhecimento a respeito do que é o certo, o que torna o meio inútil como divulgação/difusão se ocorre essa mistura.

Kinouchi em sua nova postagem no Semciência volta à questão do vocabulário. E tornamos ao início da conversa: irão aprender conceitos de modo errado, dificultando o trabalho posterior. A sequência proposta por Kinouchi: a) Nem ao menos errado; b) Errado; c) Menos errado; d) Menos errado - é barrada pelo fato de um conceito errado inibir sua própria correção.

Por outro lado, digamos que, por um meio mágico, a pessoa nunca ouviu falar em genes até o ensino médio. Haverá prejuízo à compreensão da pessoa quando finalmente ouvir o termo? Não. Ao longo de nossas vidas ouvimos milhares de expressões pela primeira vez. Reduzindo ao absurdo, teríamos que, para que possamos compreender uma palavra, precisaríamos ter ouvido falar nela antes, mas aí precisaríamos ter ouvido falar na palavra antes dessa primeira vez... Um pai (ou uma mãe), ao ensinar à criança um conceito de bola não vai fazer ela ouvir a palavra antes - digamos, balbuciar o vocabulário inteiro quando ela ainda está na barriga da mãe - simplesmente pega uma bola e diz: bola. Na verdade, a criança terá contato com a bola muito antes de ouvir a expressão bola.

Também é outra questão uma definição *parcial* apresentada de forma preliminar. Não está em discussão um conceito definido de modo incompleto - posto que não errôneo. O que está em discussão é a disseminação de conceitos *errados*.

Referências
Kirby, D.A. 2003a - Science consultants, fictional films, and scientific practice. Social Studies of Science 33(2): 231-68. Disponível em: http://online.kitp.ucsb.edu/online/resident/ouellette4/pdf/0.pdf
Kirby, D.A. 2003b - Scientists on the set: science consultants and the communication of science in visual fiction. Public Understanding of Science 12(3): 261-78. Disponível em: http://pus.sagepub.com/cgi/content/abstract/12/3/261
National Science Board 2008 - Science and Engineering Indicators. Disponível em: http://www.nsf.gov/statistics/seind08/

Cientistas aos olhos da literatura ocidental

Roslynn Haynes da University of New South Wales fez um levantamento de como as obras literárias ocidentais representam os cientistas. Ela identificou sete (o número mágico) tipos:
  • O alquimista malévolo;
  • O cientista nobre: heroi ou salvador da sociedade;
  • O cientista tolo: o ingênuo virtuoso do século 17 ou o professor com a cabeça nas nuvens;
  • O pesquisador inumano: do romatismo;
  • O cientista aventureiro: viajando no tempo e no espaço;
  • O cientista louco, malvado e perigoso: inescrupuloso no exercício do poder;
  • O cientista destrambelhado: incapaz de controlar o resultado de seu trabalho
Dos quadrinhos e dos desenhos animados podemos identificar, p.e., Victor von Doom (o Dr. Destino inimigo do Quarteto Fantástico), Reed Richards (o Sr. Fantástico do mesmo quarteto), Poindexter (amigo do Gato Félix), o Alto Evolucionário (do Universo Marvel), Dr. Benton C. Quest (pai de Johnny Quest), várias versões de Lex Luthor (arqui-inimigo de Superman) e Dexter (não o assassino serial, mas o garoto com seu laboratório).

Haynes chama esses tipos de arquétipos. Não sei se chegam a tanto. É possível se identificar tipos menores - tirando os que mesclam essas características, outros que não se encaixam bem nem em uma nem em outra categoria. Peter Parker (o alter-ego do Homem-Aranha) é um cientista interrompido - esporadicamente tentando retomar sua carreira de bioquímico/físico - suas aventuras não têm a ver diretamente com seu lado cientista (embora seja resultado indireto de sua curiosidade científica). Viktor Frankenstein, como originalmente concebido por Mary Shelley não parece ser do tipo maluco, nem está a salvar a humanidade, nem é aparvalhado - embora sua criação lhe traga problemas -, ou aventureiro por si só, nem está acima dos interesses humanos.

A distorção da imagem do cientista é confirmada por Vílchez-González & Palacios 2006 com episódios de desenhos animados exibidos na Espanha.

Agora, do mesmo modo como uma nave imperial explodindo em silêncio no vácuo do espaço não teria nenhuma graça, um Dr. Emmet Brown todo sério, tentando obter sua verba de pesquisa de um instituto de fomento não despertaria muita empatia.

Referências

Haynes, R. 2003 - From alchemy to artificial intelligence: stereotypes of the scientist in Western literature. Public Understanding of Science 12(3): 243-53.
Vílchez-González, J.M. & Palacios, F.J.P. 2006 - Image of science in cartoons and its relationship with the image in comics. Phys. Educ. 41: 240-9. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1088/0031-9120/41/3/006

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Divagação científica - disclaimer necessário

Véspera da Natal - ou de Newtal para os ateus (se é que não inventaram outra forma de laicização comemorativa - um modo de comemorar o Natal sem se sentirem culpados) - aqui vamos dando prosseguimento ao tema e à discussão com o Prof. Kinouchi e participação especial de Tatiana Nahas, do Ciência na Mídia.

Não sou tão bom em previsões quanto os scibloggers (aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui), mas um mal entendido eu previ - e tentei preveni-lo, porém não deu certo. Escrevi na postagem anterior: "Uma observação importante é que não se deve concluir, então, que filmes de ficção científica não devam ser vistos. Do contrário, seria de se fechar as escolas: as principais fontes de erros de concepção são professores e livros-textos".

Então: sim, filmes de ficção científica são, por definição, ficção - eu chamaria, em muitos casos, mais de filmes de fantasia do que de FC, porém são detalhes acribológicos com que não precisamos nos preocupar por ora. Não há proposição de que qualquer filme tenha que ter uma precisão científica em um dado nível (em muitos casos isso seria desastroso - veja quão aborrecido é 2001 - desculpas aos fãs do filme, de Kubrick e de Clarke - em relação à, digamos, Star Wars - oquei, é um exagero desmedido chamar 2001 de desastroso, porém acho que se percebe o ponto: basta pensar na graça que perderia uma Estrela da Morte explodindo sem os sons de explosão ou X-Wings manobrando lentamente com foguetes auxiliares). (Mas mesmo isso pode ter alguns limites: como o caso do filme U-571 - os americanos substituíram os ingleses, que foram os que realmente capturaram o submarino nazista durante a Segunda Guerra. Liberdade poética?)

E, não, não se deduz que professores não possam usar filmes com comentários críticos em seu arsenal pedagógico.

Mas chamo a atenção que a frase "divulgação/difusão ruim é pior do que divulgação/difusão alguma" não se refere a isso. Ela se refere à proposta de usar esses produtos culturais como forma de divulgação/difusão per se: "Música, mangás, humor, stand-up comedy são mídias populares entre os jovens que recebem pouca (nenhuma?) atenção em termos de torná-las mídias de divulgação científica. Talvez o campo da DV sofra da doença de textolatria, talvez por causa de nossa papirolatria como cientistas. No máximo, usamos formatos de alta-cultura tipo museus e exposições de fotografia científica", "é um trabalho anterior necessário ao ato de divulgação e educação científica (que correspondem a outros momentos de um processo)." (aqui, negritos meus).

O uso pedagógico de filmes é o próprio ato de educação científica. Se se vai exibir filmes em sala não há uma necessidade de exposição anterior deles.

Aliás, dado psicológico que se constata nos estudos que citei nas postagens anteriores: professores não devem exibir os filmes - especialmente os ruins - para comentar depois, vai ter mais trabalho... Devem apresentar a aula antes, enfatizar as armadilhas e depois exibir os filmes, fazendo os alunos buscarem os erros. Podem ainda intercalar trechos - com comentários imediatos (e ainda assim é arriscado).

Note-se que há uma diferença entre usar filmes como recursos didáticos - como contraexemplos, digamos - e produzir tais filmes (ou outros produtos culturais) como uma estratégia de difusão/divulgação.

Fazer limonada dado que lhes atiraram limões é diferente de provocar guerras de limões para ter suco depois.

Pelo dados apresentados, sou reticente mesmo em relação à validade da utilização do rescaldo como proposta pedagógica, mas não estou objetando contra tal metodologia.

Upideite(24/dez/2009): Fiz uma compilação da discussão e publiquei aqui.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 8

Prosseguindo o tema e a discussão com o Prof. Kinouchi.

Na postagem anterior apresentei alguns estudos que mostram como erros conceituais prévios atrapalham o processo de aprendizagem dos conceitos corretos (ou corretos segundo a visão científica corrente).

Osame Kinouchi, no seu Semciência, replicou: tais erros conceituais existem independentemente de produtos culturais de difusão científica cientificamente inacuradas.

Então vamos a alguns estudos que mostram o impacto negativo de certos produtos cientificamente inacurados sobre as concepções das pessoas.

Barnett et al. 2006 estudaram a influência do filme The Core (2003 - Missão ao Centro da Terra) sobre a visão dos espectadores a respeito de temas das geociências. O impacto foi negativo - ainda mais com a autoridade dada à personagem central do filme, que apresentava algumas ideias científicas corretas, mas que se misturavam a explicações incorretas.

Neil Comins da University of Maine catalogou mais de 1.700 erros conceituais em seus alunos e procurou identificar as fontes de origem de tais erros. Entre várias outras, desenhos animados e filmes de ficção científica. Seu estudo está compilado no livro 'Heavenly Errors'.

Uma observação importante é que não se deve concluir, então, que filmes de ficção científica não devam ser vistos. Do contrário, seria de se fechar as escolas: as principais fontes de erros de concepção são professores e livros-textos.

Kinouchi falou do aspecto de inspirar as pessoas às carreiras científicas - não duvido que isso ocorra em vários casos. Por outro lado, outras fontes poderiam motivar as pessoas a buscarem as carreiras de ciências - gerações de biólogos surgiram por conta dos documentários de Cousteau, gerações de astrônomos pela série Cosmos de Sagan. Novamente caímos na questão da difusão/divulgação de alta qualidade - com a vantagem de não se arraigar visões tão distorcidas das ciências.

Referências
Barnett et al. 2006 - The Impact of Science Fiction Film on Student Understanding of Science. Journal of Science Education and Technology 15(2): 179-91. Disponível em: http://www.springerlink.com/content/ym2556k02n3277m8/
Comins, N. 2001 - Heavenly errors: misconceptions about the real nature of the universe. Columbia University Press, 244 pp. Mais info em: http://www.physics.umaine.edu/ncomins/

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 7

Retomando o tema, Osame Kinouchi, em seu Semciência, provoca: "Talvez o problema seja uma visão limitada do que seja 'divulgação'. Acredito que divulgar o vocabulário científico, 'acostumar o ouvido' como meus professores do IFSC diziam, como faz o sit-com The Big Bang Theory, é um trabalho anterior necessário ao ato de divulgação e educação científica (que correspondem a outros momentos de um processo). Primeiro a pessoa precisa ter ouvido falar em Big Bang ou Caos ou Fractais, depois se surgir a curiosidade ela irá atrás destes conceitos."

Nos comentários ele expande essa ideia de que até difusão de pseudociência no estilo "Quem somos nós" seria válida.

Usando o vocabulário padronizado dos estudos sobre divulgação científica (aqui), o caso do BBT e similares seriam de difusão científica, mais do que divulgação.

Eu sou reticente quanto ao primeiro caso - considerar o BBT como uma forma de difusão* - e totalmente contrário ao segundo caso - incluir QSN na história.

Kinouchi considera esse posicionamento que defendo dentro do modelo do déficit - estaria a assumir uma postura purista acadêmica. Discordo. Mas mantenho o comentário que fiz em resposta a uma manifestação da subprefeita Soninha Francine: divulgação/difusão ruim é pior do que divulgação/difusão nenhuma.

Creio que se eu mostrar que essa tese é sustentável possamos desconsiderar a acusação de elitismo - o pior ou o melhor não seriam um juízo de valor e sim um juízo de fato.

Podemos elencar inicialmente ao menos duas teorias a respeito da psicologia que apoiariam essa visão. Uma é a teoria memética: memes competem entre si, se há já um meme instalado, tal qual um organismo que ocupe previamente um nicho, ele terá uma vantagem inicial (não que jamais ele seja deslocado pelo novo meme, mas sim que dará mais trabalho ao novo meme do que se não houvesse nenhum meme anterior). A outra é uma certa interpretação da teoria piagetiana: em que o processo de aprendizagem se dá em cima das preconcepções trazidas pelos indivíduos.

Mas deixando a base teórica de lado, podemos recorrer aos dados empíricos. Eaton et al. 1984 acompanharam a evolução de 6 alunos do 5o ano escolar americano com erros de concepção a respeito da visão: achavam que os objetos eram visíveis porque a luz incidia sobre eles e não porque a luz refletida alcançavam seus olhos. Cinco deles não mudaram sua concepção ao fim da unidade a explicar o processo de visão. Manzey et al. 1996 apresentam um resultado de ensino-aprendizagem mais bem sucedida - alunos com erros de concepção a respeito de evolução mostraram mudanças de concepção, mas acabaram por desenvolver um conceito híbrido entre o que tinham antes e o que lhes foi ensinado. Kendeou e van den Broek (2005) estudaram 63 alunos de graduação matriculados em uma disciplina de introdução à psicologia (o segundo grupo de estudo preferido dos psicólogos - atrás apenas de alunos de pós-graduação): os alunos que apresentaram uma preconcepção errônea de conceitos científicos, no processo de relembrar o que foi estudado, apresentaram dificuldades da compreensão dos conceitos corretos.

Referências:
Eaton et al. 1984 - Student's misconceptions interfere with science learning: case studies of fifth-grade students. The Elementary School Journal 84(4): 365-79. http://www.eric.ed.gov/ERICDocs/data/ericdocs2sql/content_storage_01/0000019b/80/31/d5/01.pdf
Manzey et al. 1996 - Misconceptions in natural selection: conceptual change through time in biology classrooms. Proceedings of the 7th International Conference on Learning sciences. Pp: 958-9. Disponível em: http://portal.acm.org/citation.cfm?id=1150198
Kendeou & van den Broek 2005 - The Effects of Readers’ Misconceptions on Comprehension of Scientific Text. Journal of Educational Psychology 97(2): 235-45. Disponível em: http://people.mcgill.ca/files/panayiota.kendeou/Kendeou2.pdf

*Que não me compreendam mal. Não tenho nada contra a série. Ao contrário, gosto bastante dela. Apenas acho que não se deve inclui-la como uma forma de difusão - p.e. em um programa de aculturação científica incluir a produção de séries humorísticas no estilo. Penso até que, para se aproveitar por completo a série e suas tiradas, é preciso ter um conhecimento prévio de ciências - é um processo oposto, portanto.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Inspire, conspire

Talvez haja uma grande organização - no estilo dos Illuminati - que procura incutir na cabeça das pessoas teorias conspiratórias mirabolantes. Assim, as pessoas, entretidas em esquemas inexistentes de dominação socioeconômica mundial, acabam deixando de prestar atenção nos planos reais de dominação socioeconômica mundial dessa grande organização. Chamarei aqui a esse grupo - sobre cuja existência não existem rastros justamente porque seus membros querem que acreditemos que não exista - de Grande Organização de Dominação, G.O.D.

Parece que só a existência de G.O.D. explicaria então a disseminação e a prevalência de tais teorias conspiratórias de várias naturezas e ordens.

Em 1994, um estudo de Ted Goertzel, com 348 moradores do sudoeste de Nova Jérsei, EUA, mostrou que 93,9% dos respondentes a uma entrevista por telefone acreditavam em algum grau em pelo menos uma de uma lista de 10 teorias conspiratórias. (Tabela 1.)

Tabela 1. Crença de americanos da Nova Jérsei, EUA,
em diferentes teorias conspiratórias. n = 348. Ano: 1994.
Entre os achados, havia uma ligação entre as crenças: quem cria em uma teoria da conspiração, tinha grande probabilidade de crer em outras - a média foi de 3,34 crenças por pessoa. Pertencer a uma minoria social estava correlacionado com uma maior propensão a crer em algumas das teorias da conspiração apresentadas; ter a sensação de falta de ordem (anomia) também; e uma correlação inversa entre crença interpessoal (ter confiança nas outras pessoas) e a crença nas teorias da conspiração. (Boa parte da relação entre fazer parte de uma minoria e acreditar nas teorias da conspiração apresentada poderia ser explicada pelo fato de indivíduos pertencentes a uma minoria tenderem a sentir anomia e a ter menor crença interpessoal.)

O quanto isso é generalizável?

Em 1999, Marina Abalakina-Paap e colaboradores fizeram um estudo com 156 estudantes da New Mexico State University, EUA. Apresentaram uma lista de 22 teorias conspiratórias. A média foi de 5,73 crenças por pessoa. Novamente, membros de minorias tendiam a acreditar mais em teorias conspiratórias. A anomia, mais uma vez, foi correlacionada com a crença em teorias conspiratórias. Outros fatores correlacionados: crença em um estado forte, baixa auto-estima, sensação de impotência, desconfiança, hostilidade e crença de que não se tem o controle sobre o destino da própria vida.

Então, ao menos o fator tempo, o fator etário e a localização não parecem afetar muito a questão da crença em teorias conspiratórias. Infelizmente esses estudos referem-se somente à situação americana. Seria a paranoia uma característica dos habitantes dos EUA? G.O.D. knows. G.O.D., bless America!

Referências
Abalakina-Paap, M. et al. 1999 - Beliefs in conspiracies. Political Psychology 20(3): 637-47.
Goertzel, T. 1994 - Belief in conspiracy theories. Political Psychology 15(4): 731-42.

Upideite(14/ago/2014):  Um estudo italiano sobre padrões de consumo de notícias relacionadas a teorias da conspiração. (HT Marcelo Cortimiglia FB.)
Upideite(23/dez/2014): Um estudo americano em cima de 4 levantamentos realizados nos EUA de 2006 a 2011 mostra que cerca de 50% dos americanos acreditam em pelo menos uma teoria da conspiração e que a crença nessas ideias está ligada ao desejo de acreditar em forças invisíveis de intenções ocultas e atração por narrativas maniqueístas. Não está ligada ao autoritarismo, conservadorismo político ou ignorância. (Via Maurício Tuffani.)
Upideite(06/fev/2016): Estudo de modelagem matemática sobre a probabilidade de conspirações putativas manterem-se ao longo do tempo de acordo com o número de conspiradores envolvidos. Esquemas com mais de 1.000 indivíduos tendem a falhar em menos de 4 anos.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Jogo dos erros

Luiz Carlos Molion da UFAL em entrevista ao UOL, como de costume, negou o aquecimento global.

Molion tem alguns trabalhos relevantes em meteorologia e climatologia, mas se põe entre os negacionistas climáticos. Não farei ilações sobre os motivos de Molion para esse posicionamento. Analiso aqui apenas as alegações feitas na entrevista.

1. Essas variações [de temperatura] não são cíclicas, mas são repetitivas.
De fato, se pegarmos o registro dos últimos milhares de anos, há vários episódios de aumento e de diminuição de temperatura. Abaixo (Fig. 1) um gráfico da temperatura na região central da Groenlândia nos últimos 50 mil anos - medidas com base na composição isotópica de O16 e O18 nas amostras de bolhas de ar presas no gelo.

Figura 1. Variação de temperatura na região central da Groenlândia. Fonte: Alley 2000.

Podemos ver o grande aumento de temperatura há cerca de 10 mil anos - painel A. De lá para cá há uma flutuação, mas em menor escala - painel B. Nos últimos 1.000 anos, a tendência geral era de queda de temperatura, tendência revertida há cerca de 200 anos. Pelas diferenças nos padrões de variação de temperatura, é pouco provável que possamos atribuir as flutuações a um mesmo mecanismo. O que nos remete à segunda afirmação - ou negação.

2. O certo é que quem comanda o clima global não é o CO2.
Isso não é certo. Provavelmente outros fatores predominaram nas escalas pregressas, mas certamente o CO2 contribui - já que ele acompanha a variação de temperatura. Podemos pensar em uma analogia - digamos um tsunami. Alguém poderia correlacionar estragos por terremotos e tsunamis e concluir: "os estragos se iniciaram após os terremotos e antes dos tsunamis, logo os tsunamis não podem ser responsáveis pelos estragos". Isso não seria o correto. Certamente parte dos estragos ocorreriam pelos tremores antes das ondas, mas estas podem contribuir até mais significativamente com os estragos. No passado, o aumento da temperatura pode ter ocorrido antes do início do aumento do CO2, mas não quer dizer que o CO2 não tenha contribuído com o aumento subsequente.

3. Se não é o CO2, o que controla o clima? O sol, que é a fonte principal de energia para todo sistema climático. E há um período de 90 anos, aproximadamente, em que ele passa de atividade máxima para mínima.
Verdade que o Sol é importante e que há períodos de máxima e de mínima solar. Mas essa contribuição não é decisiva, pelos dados disponíveis. Como dito na parte 3 da série sobre aquecimento global, o fator solar deve contribuir com no máximo 30% da variação da temperatura global observada nos últimos 150 anos.

4. Agora o sol deve repetir esse pico, passando os próximos 22, 24 anos, com baixa atividade. Vai diminuir a radiação que chega e isso vai contribuir para diminuir a temperatura global. Mas tem outro fator interno que vai reduzir o clima global: os oceanos e a grande quantidade de calor armazenada neles.
Isso é algo que poderemos acompanhar nas próximas décadas e testar.

5. [A]s estações estão sendo utilizadas, infelizmente, com um viés de que há aquecimento.
Isso não é verdadeiro. Há estações espalhadas por todo o globo (fig. 2). De fato, há mais estações, claro, nos países ricos. Mas os dados de temperatura são corrigidos de modo a refletir a média global.

Figura 2. Distribuição das estações de monitoramento de temperatura. Fonte: WorldClim.**

6. Manipularam uma série para que, ao invés de mostrar um resfriamento, mostrassem um aquecimento.
Molion está desinformado. A questão era a respeito dos dados de anéis de crescimento de árvores - que não batia com os dados a partir da década de 1960. Isso foi comentado aqui.

7. Os fluxos naturais dos oceanos, polos, vulcões e vegetação somam 200 bilhões de emissões por ano. A incerteza que temos desse número é de 40 bilhões para cima ou para baixo. O homem coloca apenas 6 bilhões, portanto a emissões humanas representam 3%. Se nessa conferência conseguirem reduzir a emissão pela metade, o que são 3 bilhões de toneladas em meio a 200 bilhões? Não vai mudar absolutamente nada no clima.
Isso não corresponde à verdade. Do contrário, nem haveria correspondência entre a emissão humana de CO2 e o teor na atmosfera (como na figura 3 da parte 3 da série), nem haveria diminuição do teor relativo de C-13 (comentado também na parte 3 da série e melhormais bem ilustrado na figura 3 desta postagem).

Figura 3. Variação no teor de CO2 e de C13 na atmosfera nos últimos 1.000 anos. Fonte: Francey et al. 1999.

8. A mídia coloca o CO2 como vilão, como um poluente, e não é. Ele é o gás da vida. Está provado que quando você dobra o CO2, a produção das plantas aumenta.
Os dados indicam que se dobrar o CO2 a temperatura global irá aumentar a níveis que tornariam a civilização humana bastante precária.

9. A gente vê o resfriamento com invernos mais frios, geadas mais fortes, tardias e antecipadas. Veja o que aconteceu este ano no Canadá. Eles plantaram em abril, como sempre, e em 10 de junho houve uma geada severa que matou tudo e eles tiveram que replantar. Mas era fim da primavera, inicio de verão, e deveria ser quente. O Brasil sofre a mesma coisa. Em 1947, última vez que passamos por uma situação dessas, a frequência de geadas foi tão grande que acabou com a plantação de café no Paraná.
Esse é um tipo de generalização a partir de um exemplo que *não* deve ser feito. Os negacionistas com razão reclamam quando uma pessoa atribui eventos específicos como o Katrina ao aquecimento global.

10. Na realidade, o que derrete é o gelo flutuante. E ele não aumenta o nível do mar.
Os dados indicam que o gelo continental da Groenlândia e do Ártico estão recuando.

11. Não está. Há uma foto feita por desbravadores da Austrália em 1841 de uma marca onde estava o nível do mar, e hoje ela está no mesmo nível. Existem os lugares onde o mar avança e outros onde ele retrocede, mas não tem relação com a temperatura global.
Novamente uma generalização a partir de um exemplo. Os dados de satélite mostram que o nível dos oceanos vem subindo ao longo do tempo (fig. 4).
Figura 4. Variação do nível dos oceanos ao longo do tempo. Fonte: Nasa/Earth Observatory.

*Além disso, em Port Arthur, na Isle of Dead, onde está o tal marco a que Molion se refere, *há* um aumento registrado no nível do mar. E mais, a região não é geologicamente inerte - o local está se *soerguendo*. Levando em consideração que o marco está ele mesmo se *elevando*, a taxa de aumento local do nível do mar é de 0,8 a 1 mm por ano.

Referências
Alley, R.B. 2000 - The Younger Dryas cold interval as viewed from central Greenland.Quaternary Science Reviews 19:213-26.
Francey et al. 1999 - A 1000-year high precision record of δ13C in atmospheric CO2. Disponível em: http://www3.interscience.wiley.com/journal/119073782/abstract.


*Upideteite(27/dez/2010): adido a esta data.
**Upideite(08/fev/2012): alterado a esta data com substituição da figura por quebra de link anterior.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Entrevista com um jornalista de ciências - Bernardo Esteves

Abaixo uma ligeira entrevista com Bernardo Esteves (mantendo o hábito de dar informações que todo mundo conhece: autor de Domingo é dia de ciência, blogueiro do Para um outro lugar, e atualmente editor da Ciência Hoje Online) sobre... é, você adivinhou: ciência e jornalismo.

GR: O diploma de nível superior não é obrigatório para o exercício da profissão. Você acha que o diploma tem importância para o ofício de jornalismo? Por quê?

BE: Sim, considero um diploma importante, mas não necessariamente de jornalismo. Uma formação em história, ciências sociais, economia ou biologia pode preparar muito bem quem quiser seguir essa profissão, a depender do ramo do jornalismo em que ele(a) pretende atuar. A técnica propriamente jornalística se aprende com o dia-a-dia da redação, e as aulas práticas na universidade contribuem de forma limitada para isso. O bom jornalista precisa ter uma cultura geral sólida e um grande domínio da língua portuguesa - um curso universitário de jornalismo deveria privilegiar mais esses aspectos do que a dimensão prática do ofício.

GR: Como você faz para se manter atualizado de todas as novidades da área? É possível decifrar as publicações científicas ou se valem mais dos releases das publicações para entenderem o que foi feito?

BE: Procuro me manter atualizado por meios variados, que incluem comunicados de imprensa de universidades e centros de pesquisa, imprensa especializada, blogues de ciência, feeds RSS diversos e, cada vez mais, o Twitter de atores variados da divulgação científica (pesquisadores, instituições, publicações etc.). Um recurso importante são os resumos para a imprensa preparados pelos periódicos mais importantes (Nature, Science, PNAS, PLoS etc.) e distribuídos com uma semana de antecedência com sistema de embargo. Isso permite que os jornalistas se preparem, consultem especialistas e preparem suas matérias com mais cuidado. Papers de algumas áreas são mais fáceis de se entender e destrinchar. Em alguns casos, no entanto, perdemos o chão logo nos primeiros parágrafos. Nesses casos, procuramos recorrer, sempre que as condições (leia-se o prazo) permitem, consultar algum cientista da área que nos ajude a interpretar e avaliar o trabalho.

GR: Com casos de fraudes e outros problemas, você considera que o conhecimento científico pode ser considerado confiável? Por quê? Como não sendo especialista no assunto pode conferir a correção do que é apresentado pelos cientistas? Acha que um cidadão comum tem mecanismos para fazer essa conferência?

BE: Esse é um problema delicado. Com a complexificação crescente do conhecimento científico, é fato que questões técnicas estão cada vez menos ao alcance do cidadão leigo. Nesse contexto, uma imprensa especializada capaz de assumir uma postura crítica em relação aos cientistas ganha um papel central na fiscalização dessa atividade para a sociedade (que -- não custa lembrar -- a financia com seus impostos). Mas não se trata de julgar se a ciência é confiável ou não: é preciso que os cidadãos entendam o conhecimento científico como algo que é construído e negociado, sujeito a revisões, contradições e superações à medida que emergem novos fatos e pontos de vista.

GR: Qual a importância do conhecimento de ciências na vida do cidadão comum? E do jornalismo de ciências?

BE: O papel do conhecimento científico é cada vez mais importante na vida dos cidadãos, e acredito que essa tendência vá se acentuar com o passar do tempo. Hoje em dia saber um pouco de ciência é condição básica para o próprio exercício da cidadania. A tomada de posição nas eleições para o legislativo e o executivo depende disso: qual é a política energética do seu candidato? E a posição dele em relação às mudanças climáticas? Aos testes com embriões humanos? Aos transgênicos? À nanotecnologia? Questões como essas tendem a ganhar importância na esfera pública. Nesse contexto, o jornalismo científico tem um papel fundamental na medida em que pode dar aos cidadãos elementos que os ajudem a formar sua opinião em relação a temas como esses.

Sing Along: Collider


Collider
Les Horribles Cernettes

via @cienciahoje, mais aqui.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Mais sobre os emails roubados - a brincadeira continua...

O que está circulando agora entre os negacionistas são comentários inseridos nas linhas de programação das análises conduzidas por Michael E. Mann. Dada a inocuidade do que eles revelam não me surpreenderia se forem verdadeiros. Reproduzo abaixo e comento:
function mkp2correlation,indts,depts,remts,t,filter=filter,refperiod=refperiod,$
datathresh=datathresh
;
; THIS WORKS WITH REMTS BEING A 2D ARRAY (nseries,ntime) OF MULTIPLE TIMESERIES
; WHOSE INFLUENCE IS TO BE REMOVED. UNFORTUNATELY THE IDL5.4 p_correlate
; FAILS WITH >1 SERIES TO HOLD CONSTANT, SO I HAVE TO REMOVE THEIR INFLUENCE
; FROM BOTH INDTS AND DEPTS USING MULTIPLE LINEAR REGRESSION AND THEN USE THE
; USUAL correlate FUNCTION ON THE RESIDUALS.
;
pro maps12,yrstart,doinfill=doinfill
;
; Plots 24 yearly maps of calibrated (PCR-infilled or not) MXD reconstructions
; of growing season temperatures.
Uses “corrected” MXD – but shouldn’t usually
; plot past 1960 because these will be artificially adjusted to look closer to
; the real temperatures.

;
E, em outra parte do código:
;
; Plots (1 at a time) yearly maps of calibrated (PCR-infilled or not) MXD
; reconstructions
; of growing season temperatures.
Uses “corrected” MXD – but shouldn’t usually
; plot past 1960 because these will be artificially adjusted to look closer to
; the real temperatures.
Os arquivos em que estão tais linhas são: maps12.pro, maps15.pro, maps24.pro. IDL é uma linguagem de programação de análise de dados (Interactive Data Language). O que Mann tinha eram várias séries de dados com as datas correspondentes. A ideia era ver como todos esses dados estavam correlacionados uns com os outros e como isso influi na temperatura - a contribuição individual de cada fator. Depois disso, essa influência poderia ser removida para saber a relação específica entre a temperatura e os dados dos anéis das árvores - mais especificamente de um dos componentes, a densidade máxima da madeira formada no fim do período de crescimento anual. O texto destacado em vermelho, que os negacionistas têm por comprometores, na verdade, revela o cuidado que tiveram Mann e colaboradores para *não* contaminar os dados - evitar que a curva se ajustasse aos dados de modo artificial.

Pequeno glossário dos termos:
  • datatresh - data threshold
  • depts - dependent time series
  • indts - independent time series
  • mkp2correlation - ?McKinley Park correlation
  • MXD - maximum latewood density
  • PCR - principal component regression
  • p_correlate - função de correlação parcial do IDL
  • refperiod - reference period
  • remts - multiple time series ?regression random effect model time series*
  • yrstart - year of start

Sobre o comitê revisor independente na auditoria dos dados da CRU/EAU: aqui.

Terão que cavoucar mais nos emails.

*Upideite(08/12/2009).

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Mais sobre os emails roubados - a coisa tá ficando feia...

Sério, a coisa está ficando feia... Para os negacionistas. Não todos, mas para uma parte deles.

Monbiot publicou uma postagem em seu blogue em que reproduz um email de Ernst Kattweizel da Universidade Redcar do Reino Unido. Tanto o pesquisador quanto a instituição são falsasfalsos. Sim, claro que o email também é uma peça de ficção.

Mas mesmo que não se soubesse que não existe nenhum Ernst Kattweizel - que não existe uma redcar.uk.ac é só colocar na caixa de endereços de seu navegador (isso se não bater um desconfiômetro - quem é que colocaria o nome de "Carro Vermelho" em uma instituição acadêmica?) - bastaria ler o email, mesmo sem muita atenção.

A peça é hilária. Meu trecho preferido:
"The capture of George W Bush, a late convert to the cause of Communist World Government, was made possible only by the threatened release of footage filmed by a knight at Yale, showing the future president engaged in coitus with a Ford Mustang."
Oquei, um humor um tanto escatológico.

E o inexistente senhor Kattweizel assina:
"Professor Ernst Kattweizel, University of Redcar. 21st Grand Warden of the Temple of the Knights Carbonic."

Mesmo que ele existisse fora da mente de Monbiot, estaria mais do que patente a galhofa.

O Blog da Terra entrou na onda e publicou a brincadeira.

Mas o que aconteceu? Alguém ou um grupo de pessoas que não leu impressionou-se com o título da postagem: "Vazamento de emails coloca em dúvida dados sobre aquecimento global" e mandou bala. Está circulando por aí - eu recebi de duas fontes com o título: "Caindo a máscara do aquecimento global antropogênico". Pelo que entendi está circulando no meio cético - não, é cético mesmo, não os negacionistas climáticos, no meio do pessoal que defende o racionalismo, as ciências, combate as pseudociências e, muitos deles, as religiões. Isso aí, gente racional, que gosta de examinar a lógica das coisas engolindo tal disparate - pelo que me parece obsedado pela ideologia de se negar o aquecimento global antropogênico (mas isso é só uma impressão que me passa).

Então, gente, vou desenhar, ok?

Montagem baseada em figuras retiradas do Flickr e do Wikimedia Commons

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Entrevista com um jornalista de ciências - Reinaldo José Lopes

Abaixo uma breve entrevista com o jornalista Reinaldo José Lopes (autor, vocês sabem, do Além de Darwin, do sciblogue: Carbono 14 e atualmente trabalhando como repórter da Folha de São Paulo) sobre ciências e jornalismo (dããã).

GR: O diploma de nível superior não é obrigatório para o exercício da profissão. Você acha que o diploma tem importância para o ofício de jornalismo? Por quê?

RJL: Acho que, da maneira como os cursos de jornalismo funcionavam até hoje, não. Por um motivo simples: eles estavam estruturados de um jeito ruim, sem dar uma formação sólida em nenhuma área pros estudantes. E o dia-a-dia da profissão era aprendido mesmo "na raça", já quando íamos para o mercado de trabalho. Acho que alguém formado num bom curso de letras, história ou mesmo biologia está mais preparado do que alguém formado num curso de jornalismo como eles são hoje.

GR: Como você faz para se manter atualizado de todas as novidades da área? É possível decifrar as publicações científicas ou se valem mais dos releases das publicações para entenderem o que foi feito?

RJL: Fazendo o que você disse: lendo as publicações científicas e conversando com cientistas. Os jornalistas têm a grande facilidade de poderem se cadastrar junto às grandes revistas científicas e lerem de graça os artigos de maior impacto. É possível decifrar ao menos o conteúdo principal desses artigos se você tiver uma base boa de ciência no ensino médio e vontade de aprender. Quanto mais você se dedica a entender as questões científicas, mais fácil fica decifrar tais textos.

GR: Com casos de fraudes e outros problemas, você considera que o conhecimento científico pode ser considerado confiável? Por quê? Como não sendo especialista no assunto pode conferir a correção do que é apresentado pelos cientistas? Acha que um cidadão comum tem mecanismos para fazer essa conferência?

RJL: De fato, é um conhecimento que não pode ser seguido cegamente -- mas isso vale para qualquer outro tipo de conhecimento. O importante é o sistema de autocorreção da ciência, em que resultados precisam ser replicados por outros pesquisadores para valer, e todos querem tentar achar as fraquezas nos dados e no raciocínio dos outros. Há uma certa seleção natural. Sobre não ser especialista: até aí, também dentro das ciências a especialização é tamanha que pouca gente seria capaz de se considerar expert em tudo. Creio que o importante é tentar entender o grande quadro teórico no qual uma pesquisa se insere, ver se há coerência dentro dele, e sempre ter em mente que aquele resultado é provisório. O mesmo vale para o cidadão comum: ele tem de estar ciente sobre como a ciência é provisória e tomar decisões com base nisso, inclusive não subordinando absolutamente políticas e diretrizes éticas apenas aos dados da ciência, embora recebendo o input dela.

GR: Qual a importância do conhecimento de ciências na vida do cidadão comum? E do jornalismo de ciências?

RJL: Claro que a inovação tecnológica e o crescimento econômico hoje dependem da ciência. Desafios éticos estão por todo o lado nas ciências da vida modernas. Mas o mais importante, creio, é a ampliação dos horizontes humanos que a ciência proporciona, e é isso que todos nós podemos e devemos ter em mente. Pro jornalista da área, além de ser uma ferramenta básica, o conhecimento de ciências é a principal arma para fomentar uma sociedade que entenda melhor o Universo e a si mesmo. E isso não tem preço.

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