Algumas considerações extras a respeito da interpretação de Hoover de que estruturas mineralizadas em meteoritos CI1 seriam fósseis de cianobactérias.
Veja abaixo uma representação simplificada da "árvore da vida" - as relações evolutivas de membros dos três grandes grupos de organismos vivos inferidas por análise genética.
O balão vermelho indica a posição das cianobactérias. A seta vermelha indica a posição inferida da raiz da árvore - a posição do último ancestral em comum de todos os organismos atuais da Terra.
Segundo a interpretação de Hoover, as estruturas seriam de organismos que estariam em algum ponto dentro do balão. Se aceitarmos isso, há duas interpretações possíveis: 1) A raiz verdadeira estaria em algum ponto dentro do balão ou 2) a Terra foi 'semeada' também com ancestrais das arqueas, de outras bactérias e também de eucariotos.
O deslocamento da posição da raiz tornaria completamente estranho o padrão genético encontrado. Há certos genes que estão duplicados no genoma de bactérias, arqueas e eucariotos. Esses genes surgiram de uma mesma cópia ancestral e divergiram a partir disso. Analisando-se a sequência, pode-se inferir a sequência da cópia ancestral - e comparando-se com isso, podemos posicionar a raiz da árvore. Esse esquema elegante é bagunçado se a verdadeira raiz estiver longe da posição inferida por essa técnica. Um padrão altamente improvável de evolução das sequências haveria de ocorrer - a partir das cianobactérias, os dois genes iriam *convergir* suas sequências e voltariam a divergir rumo às arqueas e aos eucariotos.
Consideremos então que toda uma diversidade ancestral aportou na Terra, incluindo nossos ancestrais protoeucariotos. Ocorre que o meteorito tem idade que remonta às origens do Sistema Solar. Essa diversidade teria surgido em um intervalo de não muito mais do que alguns milhões de anos. E ficado oculta por bilhões de anos no registro fóssil de nosso planeta. Se as cianobactérias já estavam presentes praticamente desde o início na Terra, por que a crise ou a revolução do oxigênio (ou ainda o Grande Evento da Oxigenação) ocorreria só há uns 2,4 bilhões de anos atrás?
Outra coisa. Os meteoritos CI1 devem ser restos ou de cometas ou de asteroides - não de corpos como planetas ou protoplanetas. Os organismos apontados como parentes próximos dos supostos fósseis como o Titanospirillum velox são móveis - deveria haver água líquida. Cometas são formados basicamente de gelo; quando se aproximam do Sol, o gelo não se liquefaz, mas sublima. Asteroides não são também bons locais em que esperaríamos água líquida em abundância. #comofaz?
domingo, 6 de março de 2011
Mais sobre os "fósseis" em meteoritos
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10 comentários:
Engraçado que fósseis com sinal de vida alienígena já "caíram" três vezes nas mãos desse mesmo indivíduo que é o Richard Hoover...
Outro paper aqui: http://spie.org/x648.html?product_id=278766
A biografia dele no Wikipédia indica mais um, mas não consegui encontrar o original.
Enfim..
Salve, Érico,
A outra é a mesma que foi publicada no artigo de agora. Era uma apresentação de simpósio.
Tenho uma suspeita sobre esse intervalo de 4 anos desde o NSSTC Space Sciences Colloquium de 2007 até a publicação em uma revista praticamente marginal.
[]s,
Roberto Takata
Essa é uma informação muito relevante Érico, não sabia. Ele até cita esses trabalhos dele no artigo. Eu esperava que a NASA fosse uma instituição mais séria e que não permitisse especulações desse tipo. Me enganei pelo visto.
um abraço,
André
Por sinal, já estão disponíveis algumas das críticas ao artigo. vejam no link: http://journalofcosmology.com/Life101.html
Rabelo,
Grato pelo link.
A maioria dos comentários não fazem sentido praticamente algum...
[]s,
Roberto Takata
Takata,
escrevi um texto sobre as críticas no meu blog, e citei alguns trechos do seu blog. Segue o link:
http://cienciaumavelanoescuro.haaan.com/?p=187
um abraço,
André
O PZ Meyers recebeu um email de um dos editores da revista, com um artigo de autoria dele anexado para leitura. O artigo defende que a vida no Universo começou não muito depois do Big-Bang - na realidade há 14 bilhões de anos! - e de lá pra cá tem viajado por aí de carona nos meteoros.
Na Terra parece que a grande maioria vai sempre pro mesmo cara: Richard Hoover!
André Luiz,
Valeu.
Erico,
É, eu li a nova postagem do Meyers. Só não sei como elementos mais pesados do que lítio estariam presentes em quantidade significativa tão cedo na história do Universo. Não é à toa que Meyers tá pegando engulhos de astrobiologia. (Embora haja gente séria na área.)
[]s,
Roberto Takata
Segundo Lane, "Oxygen - The molecule that made the world", Oxford University Press, 2002, pp. 35-36, as evidências mais concretas sobre o surgimento das cianobactérias datam de 2,7 bilhões de anos atrás. Se a Terra existe há pelo menos 4,5 bilhões de anos (estima-se entre 4,5 e 6 bilhões de anos), e se, segundo Hoover e outros, as cianobactérias são muito mais primitivas, porque não existe um maior número de evidências sobre este fato aqui na Terra? Como assinalado por todos os comentários, porque somente Hoover é o felizardo? Como ninguém observou isso antes?
Salve, Berlinck,
Até tem um indício mais antigo de estromatólito - datado de 3,45 Ga (http://www.pnas.org/content/106/24/9548.abstract). Mas se a panespermia proposta por Hoover e cia. estivesse correta, seria de se esperar uma influência bem precoce da biota sobre a Terra (uma origem bem cedo de Gaia).
Não haver trabalhos anteriores em meteoritos tão antigos pode ser atribuído ao fato deles serem raros e poucos pensarem que seria viável a existência de vestígios de fósseis nesses corpos.
O trabalho seria menos problemático se não sugerisse formas tão derivadas tão cedo na história do Sistema Solar.
[]s,
Roberto Takata
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