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quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Ciência: coisa de criança?

Interessantes as similaridades dos padrões temporais de pesquisa na internet por 'ciência' no Brasil (Fig. 1) e 'science' nos EUA (Fig. 2). Os gráficos abaixo foram obtidos pelo Google Trends.

Parece haver uma tendência de queda geral na busca por 'ciência' ou 'science' e a intensidade de pesquisa é fortemente influenciada pelas férias escolares: sofrendo uma forte depressão nas férias de inverno e de verão (especialmente nas de verão, mais prolongadas - entre dezembro e fevereiro no Brasil e entre fim de maio e meados de agosto nos EUA).

Figura 1. Padrão de pesquisa pelo termo 'ciência' no Google a partir do Brasil.

Figura 2. Padrão de pesquisa pelo termo 'science' no Google a partir dos EUA.

Tanto no Brasil como nos EUA, não são os estados particularmente mais populosos e economicamente significativos que se destacam nas buscas.

Será que o padrão é gerado por trabalhos escolares encomendados aos alunos?

Em Portugal, essa distribuição não é tão evidente (Fig. 3).
Figura 3. Padrão de pesquisa pelo termo 'ciência' no Google a partir de Portugal.

Outros termos relacionados a disciplinas escolares, como 'matemática', 'biologia' e 'geografia', seguem o mesmo padrão (Figs. 4a-c).

a)b)c)
Figura 4. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'matemática', (b) 'biologia' e (c) 'geografia' no Google a partir do Brasil.

Muitos termos não relacionados a disciplinas escolares apresentam padrões diferentes. Como o caso de novela, futebol e viagem (neste último caso, o padrão é o inverso - picos de busca justamente nos períodos de férias escolares) (Figs. 5a-c). Mas 'economia', segue o padrão de redução de buscas nas férias (Fig. 5d).

a) b)
c) d)
Figura 5. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'novela', (b) 'futebol', (c) 'viagem' e (d) 'economia' no Google a partir do Brasil.

Como férias escolares coincidem com férias letivas no ensino superior, isso pode explicar o padrão de 'economia' condizem com o de disciplinas do ensino básico. Termos 'TCC' e 'direito' (Figs. 6a-b) apresentam a mesma distribuição de frequência de buscas.


a) b)
Figura 6. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'TCC' e (b) 'direito' no Google a partir do Brasil.

Alguns termos científicos mais específicos, como 'DNA', 'nanotecnologia', 'aquecimento global', 'transgênicos' (Figs. 7a-d), seguindo igual tendência, parecem indicar que suas buscas são motivadas por trabalhos escolares/acadêmicos. O caso de 'transgênicos' é ainda mais extremado - caindo a zero durante o período de férias. O grande momento da pesquisa sobre 'aquecimento global' foi em 2007, quando houve o relatório do 4o IPCC em que se chegou ao amplo consenso científico sobre o 'aquecimento global antropogênico' e houve grande cobertura midiática.

a) b)
c) d)
Figura 7. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'DNA', (b) 'nanotecnologia', (c) 'aquecimento global' e (d) 'transgênicos' no Google a partir do Brasil.

Esses resultados podem indicar que não devemos ser tão otimistas com resultadosdados de pesquisa de opinião que descrevem o brasileiro como interessado em ciências. Mesmo que o universo dos que têm acesso regular à internet e saibam usar os mecanismos de busca seja restrito, entre esses - em geral com melhores condições socioeconômicas - o interesse parece se resumir a resolver tarefas escolares. Termos como 'novelas' e 'futebol' mostram que, quando há interesse, os internautas brasileiros sabem como buscar mais informações (ou ao menos tentar encontrá-las).

Uma ampla cobertura midiática, sem surpresas, afeta o interesse das pessoas em obter informações mais detalhadas.

A tendência geral de queda das buscas por temas ligados às ciências talvez se deva a uma modificação demográfica das pessoas que acessam a internet, com uma diluição da fração de acadêmicos e estudantes (por favor, não falem em orkutização... ops!).

Alguém a fim de fazer um levantamento mais sistemático e aprofundado sobre o tema? (Deve valer pelo menos um TCC.)

5 comentários:

Unknown disse...

Ainda penso que vivemos em uma bolha acadêmica. Quem fala de ciência são apenas as pessoas que se relacionam de alguma maneira com ela, seja na escola ou no trabalho. Pessoas com rotina distante dos meios de produção e discussão científica não ouvem falar, nem se interessam por ciência.

E quem quiser fazer o TCC com o tema deve passar por aqui. Você já fez uma boa parte do trabalho.
Parabéns Roberto.

none disse...

Salve, Beijamini,

Aparentemente as escolas não estão conseguindo passar uma cultura de interesse permanente em ciências (e em outras áreas do conhecimento).

E não só as escolas...

Valeu pela visita e comentário.

[]s,

Roberto Takata

Leonardo de Oliveira Martins disse...

Talvez o google correlate possa ajudar a encontrar os termos mais parecidos? Por exemplo buscando por science a expressão "school science experiments" é a terceira com maior correlação.

none disse...

Salve, Martins,

O Correlate é interessante, sim. Pena que abrange só os EUA.

[]s,

Roberto Takata

Osame Kinouchi disse...

Roberto,

Se o eixo y é medido em trafego percentual (nao deu pra ver isso nos graficos, as legendas estao pequenas na minha tela), entao o simples aumento da populacao com acesso a internet devera produzir esse efeito de diminuicao interanual de busca por "ciencia" e correlatos. Ou seja, o efeito é espurio. Por outro lado, o efeito sazonal é real, mas trivial. Assim, proponho que o interesse do brasileiro (ou do pessoal de lingua portuguesa) pela ciencia seja medido pelo nivel de busca por ciencia durante as ferias, com um detrend para descontar a influencia demografica (cada vez mais pessoas usam internet para diversao e redes sociais, menos para pesquisar informacao e fazer trabalhos escolares). Por falar nisso, o que vc acha da proposta de Freeman Dyson de acabar com o ensino de Fisica, Biologia e Quimica no Fundamental e Medio, substituir isso por ensino de Matematica (mais forte), Estatistica, Logica, Computacao, Portugues, Ingles etc (ou seja, enfase em ferramentas e linguagens, nao em conhecimento datável). A aprendizagem em ciencia se daria em clubes de ciencia com monitores (na cidade ou dentro das escolas, mas nao em aulas obrigatorias para todos) visando a participacao em Olimpiadas (de fisica, matematica, biologia, quimica etc). Nao seria mais produtivo e, ao mesmo tempo, sera que poderiamos assim solucionar o problema de deficite de professores capacitados, eliminar um monte de cursos de licienciatura em ciencias inuteis e de baixo nivel etc?

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