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segunda-feira, 26 de maio de 2014

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 22

Westerman et al. 2014 analisaram a influência da recentidade das atualizações e a credibilidade das informações nas mídias sociais.

Abaixo minhas anotações. Mas, sim, de modo geral, perfis oficiais de twitter que atualizam constantemente as informações são vistos como de credibilidade maior - porém, por via indireta.
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Waterman, D.; Spence, P.R. & Van der Heide, B. 2014. Social media as information source: recency of updates and credibility of information. Journal of Computer-Mediated Communication 19(2): 171-83.

Os autores testaram três hipóteses:
H1 - Recentidade da atualização em um perfil de mídia social é associado positivamente com a credibilidade da fonte.
H2 - A credibilidade é positivamente associada com elaboração cognitiva.
H3 - Há uma associação positiva entre recentidade e elaboração cognitiva.

181 cobaias sujeitos experimentais preferidos em testes dessa natureza (aka alunos de graduação - no caso, de curso introdutório de comunicação em uma grande universidade do Meio Atlântico dos EUA) foram arrolados (em troca de créditos acadêmicos).

Os alunos foram divididos em três grupos: 63 foram apresentados a uma página no twitter da American Heart Association cuja última atualização era de cerca de 1 minutos atrás; para 56 alunos a atualização era de cerca de 1 hora atrás e para 62, cerca de 1 dia atrás.

Após visualizarem as páginas fakes (naturalmente sem estarem cientes de que se tratava de uma página falsa), todos responderam a dois questionários, uma para elaboração cognitiva (5 questões como 'quando via a página, pensava a respeito dela várias e várias vezes', com as quais atribuíam um de 5 graus de concordância/discordância) e outro para medição da credibilidade da fonte (com três dimensões: competência [competence], afeição [godwill] e confiabilidade[trustworthiness]).

Tabela 1. Credibilidade e elaboração cognitiva por condição de atualização.
competência afeição confiabilidade elaboração cognitiva
rápida 4,95 (0,97) 4,83 (0,97) 5,09 (0,92) 2,98 (0,61)
média 4,70 (1,17) 4,54 (1,07) 4,74 (0,99) 2,89 (0,66)
lenta 4,92 (1,13) 4,71 (0,81) 4,96 (0,97) 2,78 (0,74)
Média (Desvio Padrão)

A hipótese H1 não é sustentada diretamente - não há uma diferença significativa em qualquer uma das dimensões de credibilidade por condição de atualização (Tabela 1).

A hipótese H2 foi mantida - houve relação positiva entre elaboração cognitiva e a credibilidade - no todo e nas dimensões.

A hipótese H3 também foi mantida - havendo associação positiva entre elaboração cognitiva e recentidade da atualização (Tabela 1).

Embora não haja uma relação direta entre recentidade da atualização e credibilidade, um modelo em que a recentidade afeta a credibilidade por meio da elaboração cognitiva apresenta uma boa aderência aos dados.

Os autores especulam que a taxa de atualização do twitter estaria por trás do crescimento do número de seus usuários. Talvez seja o caso, mas analisando o crescimento de outras mídias baseadas na internet esse fator não parece muito óbvio (Fig. 1).

Figura 1. Crescimento de número de usuários de mídias baseadas na internet. Fonte: Forbes.

Entre as limitações que os autores listam para o estudo está o pequeno efeito da recentidade na elaboração cognitiva. Pode ser que o tema escolhido - doenças coronárias - não necessite de constante atualização. Um tema que envolva mais urgência poderia ser melhor na análise da relação entre atualização e credibilidade, porém isso poderia envolver a necessidade de manipular alguma crise que levasse as pessoas a procurar por mais informações a respeito - o que não é uma tarefa muito simples. Haveria de se esperar por experimentos naturais de crise (guerra, epidemias, desastres naturais...).

Os sujeitos experimentais também limitam o alcance do estudo - embora sejam naturalmente usuários intensivos de mídias sociais, possivelmente não é um público naturalmente preocupado com doenças cardíacas.

A escala Perse (1990) usada para medir a elaboração cognitiva tem um grau de confiabilidade aceitável (0,68), mas relativamente baixa. Isso pode significar que o baixo efeito da recentidade da atualização pode, na verdade, ser maior. Em todo caso é outra limitação.
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Obs: Um tanto irônico notar o histórico da publicação do estudo - que trata da necessidade de atualização rápida:
Submissão: 08/jul/2011; Revisão: 09/mai/2012; Aceitação: 16/jun/2012; Publicação online do artigo: 08/nov/2013; Publicação online da edição: 16/jan/2014. Muito possivelmente, os estudos foram conduzidos em 2010.

Estou analisando um resultado que se refere a uma dinâmica de 4 anos atrás. A dinâmica das mídias sociais é muito mais veloz do que isso: o Whatsapp, criado em 2009, ainda estava decolando na época do estudo, pouco depois de sua publicação, seria comprado pelo Facebook - a academia precisa arranjar um meio para acompanhar essa velocidade de transformações. Claro que todo estudo científico se refere mais diretamente a um evento passado, mas, para a maioria dos fenômenos, supõe-se que seja extrapolável ao presente (quando não simplesmente transposto); mas nesta área de mídias sociais isso muitas vezes (quase sempre?) não é o caso.

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