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sábado, 26 de setembro de 2015

Divagação científica - divulgando ciências cientificamente 23

A fim de expressar minhas reticências à sugestão do cineasta Fernando Meirelles de se abandonar o uso de número para se divulgar ciências, trouxe o estudo de Van der Linden et al. 2015 sobre o efeito de porteira de crença da estatística de consenso entre especialistas sobre a realidade do AGA no convencimento das pessoas.

Agora faço anotações de outros estudos comparativos dos poderes persuasivos de argumentos numéricos e narrativos.

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Allen & Preiss 1997. Comparing the persuasiveness of narrative and statistical evidence using meta‐analysis. Communication Research Reports 14(2): doi: 10.1080/08824099709388654.

Uma meta-análise de 15 estudos sobre o poder persuasivo de mensagens com provas numéricas em comparação de mensagens com exemplos ou estórias. Em 10, o efeito maior era de mensagens com números; em 4, o efeito era maior em mensagens com narrativas; em 1, não havia diferença. No total, 1.740 indivíduos foram envolvidos nesses estudos.

Considerados em conjunto, há um efeito maior (mas não muito: r = 0,101) de persuasão no uso de indícios estatísticos em relação a narrativa ou relatos anedóticos. As amostras são heterogêneas entre si, o que pede uma certa cautela para a generalização, já que indica a ação de outros fatores.*

Tabela 1. Efeito de convencimento de argumentos estatísticos x. narrativo.
Fonte: Allen & Preiss 1997
tipo de indício não convencido (%) convencido (%)
estatístico 45 55
narrativo 55 45

**Zebregs et a. 2014. The differential impact of statistical and narrative evidence on beliefs, attitude, and intention: A meta-analysis. Health Communication, doi: 10.1080/10410236.2013.842528.

Os autores contestam a seleção dos trabalhos incluídos em Allen & Preiss 1997 (dissertação e artigo baseado no trabalho da dissertação; estudos que não isolam adequadamente os indícios narrativos dos indícios estatísticos...). Dos 15 estudos incluídos nesta meta-análise, apenas 2 estavam incluídos em Allen & Preiss 1997. Porém a conclusão é basicamente a mesma.

Indícios estatísticos levam a um maior convencimento - modificação da crença - do que indícios narrativos (com efeito da ordem de 16%).

número de estudos n total tamanho do efeito IC p
Crença 9 1.546 -0,16±0,07 -0,29;-0,03 0,014
Atitude 5 1.850 -0,11±0,06 -0,23;0,00 0,058
Intenção 7 1.338 0,10±0,05 0,00;0,20 0,061

As amostras não se mostraram heterogêneas, indicando que não há participação significativa de outros fatores na variância dos efeitos na crença, atitude e intenção.

(Aparentemente os autores consideram um alfa maior do que 0,05, já que consideram como significativo o efeito sobre a atitude e a intenção - no caso da intenção, os indícios narrativos teriam um efeito maior.)

Allen et al. 2000. Testing the persuasiveness of evidence: combining narrative and statistical forms. Comunication Research Reports 17(4). doi: 10.1080/08824090009388781.

Sujeitos experimentais: 1.270 estudantes universitários da região do Meio-Oeste americano.
Tratamentos: 15 mensagens de tópicos variados (e.g. uso de cosméticos por mulheres) em 4 versões: a) mensagem sem indícios narrativos nem estatísticos; b) mensagem com indícios narrativos, mas não estatísticos; c) mensagem sem indícios narrativos, mas com estatísticos; d) mensagem com indícios narrativos e com indícios estatísticos.
Medidas:
Os fatores de medida de credibilidade do autor foram:
- o autor conhece o tópico;
- o autor é sincero;
- pode-se acreditar no autor;
- o autor é desonesto;
- o autor é digno de confiança;
- o estilo da escrita é dinâmico.

Os fatores de medida de persuasão foram:
- aceito a conclusão da mensagem;
- concordo com a conclusão do autor;
- acho que o autor está errado;
- minha opinião é consistente com a mensagem do autor;
- acredito na conclusão da mensagem.

Resultados: mensagens com indícios narrativos *e* estatísticos tiveram melhores notas de persuasão: 17,91±5,16; seguidas de mensagem com indícios estatísticos apenas: 17,58±5,21; mensagem somente com indícios narrativos: 17,32±4,99; e, por último, mensagens sem indícios narrativos nem estatísticos: 17,22±5,11.

Não houve diferenças entre os tratamentos na avaliação da credibilidade do autor.
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Bom notar que, aparentemente, de acordo com outros estudos (que não foram contemplados nesta postagem) há variação do efeito do uso de dados estatísticos no convencimento em função do público-alvo das mensagens, da localização no discurso dos indícios numéricos e narrativos, do tópico das mensagens...

*Upideite(28/set/2015): adido a esta data.
**Upideite(28/set/2015): adido a esta data.

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