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segunda-feira, 11 de abril de 2016

Como é que é? - Sexo não tem a ver com o tipo de brinquedo?

Parece haver uma opinião (geralmente não técnica) crescente - embora possivelmente ainda minoritária (não vi dados de pesquisa de opinião para sustentar isso, apenas de modo indireto baseio-me nas práticas comerciais predominantes como um indicador da cultura prevalente - o que é sujeito a erros, claro) - de que os tipos de brinquedos (carrinhos e revólver vs. bonecas e eletrodomésticos em miniatura) preferidos por meninos e meninas são produtos meramente de fatores culturais.

Por exemplo:
["Acha que a astromancia é zoada? Alguns pais acreditam que a forma dos genitais de um bebê prediz seu brinquedo, passatempos e cores preferidos."]

Figura 1. Fluxograma que se baseia na ideia de não se fazer distinção de sexo/gênero quanto a brinquedos infantis. ["Como saber se um brinquedo é de menino ou de menina. O brinquedo é acionado com os genitais? Sim. Não é para crianças. Não. É tanto para meninos quanto para meninas."] Fonte: Dueling Analogs.

Pessoalmente sou simpático à ideia de que na criação (dos próprios filhos) evite-se a distinção entre tipos de brinquedos.

Agora, isso não quer dizer que não haja nenhuma tendência inata de preferência por parte das crianças a certos tipos de brinquedos de acordo com seu sexo.

Ao contrário, há vários indícios de que *existe* essa preferência inata.

Meninos com comportamento mais associado a garotas (usar roupas femininas, socializar-se mais com garotas, comentar sobre a roupa da mãe, verbalizar que gostaria de haver nascido menina, ter a mãe como modelo de vida,uso de joias e cosméticos, brincar de casinha) e meninos com comportamento mais associado a garotos (brincadeira física, socializar-se mais com outros meninos, prefere o pai ou gosta igualmente de ambos) foram acompanhados ao longo de 7 (sete) anos. No primeiro grupo, 17% tinham como brinquedo preferido boneca do tipo feminina; no segundo grupo: 0%. (Green 1976.)

Em primatas como chimpanzés e macacos verdes, cativos e selvagens, é detectada a preferência dos filhotes por brinquedos de acordo com o sexo similar a de crianças humanas.

Meninas com hiperplasia adrenal congênita (CAH) são expostas tanto no útero como após o nascimento a níveis mais elevados de androgênios do que as meninas sem essa condição. Garotas com CAH têm maior tendência a brincarem com brinquedos associados a meninos e menos com os associados a meninas. Garotos com CAH não apresentam alterações em relação aos meninos sem a condição. (Barenbaun & Hines 1992.)

Alexander (2003) defende que essa preferência diferencial envolve dimorfismo sexual do sistema visual. Para os homens, com o sistema visual ligado às células-M, envolvidas no rastreamento de movimentos, mais desenvolvido (selecionado em função das atividades de caça, reservadas primordialmente aos primatas do sexo masculino): brinquedos associados a meninos, como carrinhos e bola, estimulariam tal via. Já para as mulheres, com o sistema visual sendo ligado mais às células-P, envolvidas com cores e formas (que ajudariam na tarefa de forrageamento de plantas e frutos e cuidado de crianças- como reconhecimento de expressões faciais): brinquedos associados a meninas, como bonecas coloridas e cheias de expressões, estimulariam essa via.

Incorreríamos na falácia naturalista se, constatada essa base biológica inata, insistíssemos que seria errado meninos brincarem com bonecas e meninas com carrinhos. Mas, dado que existem esses indícios, não faz sentido simplesmente ignorá-los para sustentar a tese de que as diferenças são meramente culturais.

Não se trata aqui tampouco de negar o peso cultural nessa preferência. E sim de reconhecer, como em tantas outras características dos seres vivos em geral e dos humanos em particular, uma interação entre fatores genéticos e ambientais (incluindo o modo de criação e socialização).

2 comentários:

Paulo Topa disse...

Questão interessante e sempre alvo de discussão. Gostei da forma como foi colocada a questão.

none disse...

Salve, Topa,

Obrigado pela visita e comentário.

De fato, é um tema que se cerca de muita polêmica - imagino que em boa parte por se ligar a uma discussão mais ampla (e mais polêmica) do sexismo, de um lado, e da natureza vs. criação, de outro.

[]s,

Roberto Takata

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