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quarta-feira, 3 de abril de 2013

Especulando: Regulamentação da profissão de cientista = valorização do trabalho?

A neurobióloga Suzana Herculano-Houzel havia lançado seu manifesto para o reconhecimento de "cientista" como profissão. Expôs rapidamente sua ideia em entrevista recente ao Roda Vida da TV Cultura de São Paulo (só no quarto bloco teve a oportunidade*).

 

Após o programa, um deputado entrou em contato com a cientista para discutir a proposição de uma lei de regulamentação da profissão de cientista. Herculano-Houzel está fazendo uma enquete com seus leitores para preparar sua apresentação no Congresso Nacional.

Pelos compartilhamentos no twitter, facebook e G+, vários colegas e conhecidos meus, a maioria pós-graduando ou recém pós-graduados, estão animados.

Eu não tenho barba, mas as coloco um pouco de molho. Expus mais detalhadamente minhas discordâncias (e concordâncias) com a proposta de SHH aqui mesmo no GR.

Ainda é fase inicial e não sei se e como serão ouvidas outras partes na elaboração desse projeto de lei. A impressão que tenho é que o andar da carruagem está em um ritmo acelerado - mais do que sugeriria a prudência em uma estrada esburacada que se atravessa.

A minha sugestão é que, afinal estamos lidando com cientistas, apliquemos uma metodologia científica por excelência: teste-controle com divisão aleatorizada dos sujeitos. *Antes* de se fazer qualquer lei, testemos a hipótese central da proposta de SHH: regime de contrato para pesquisa em vez de docência nas IES públicas e pós-graduação profissionalizada. Teríamos algumas instituições em que se trabalharia com o regime atual e outras com o novo regime proposto. Os candidatos passariam em um concurso comum e, posteriormente, seriam encaminhados a um ou outro sistema**. Ao fim do período do experimento, compararíamos os resultados. Não sei qual alfa deveríamos usar nos testes estatísticos de comparação: se o 5% tradicional, um maior (10%?) ou um mais rigoroso (1%?). Tendo a ser favorável a uma condição mais liberal: um alfa de 10%, no caso.

Infelizmente não seria possível trabalharmos com um teste duplo cego. Não seria nada cego, aliás, já que os sujeitos experimentais saberiam exatamente em qual sistema estariam engajados. E demandaria mais pelo menos uns 10 anos para uma condição minimamente razoável de comparação.

De todo modo, creio que seria melhor ter uma base empírica antes de sair modificando todo um sistema que, com todos os seus defeitos, não é completamente disfuncional.

*Upideite(03/abr/2013): adido a esta data.
**Upideite(03/abr/2013): haveria uma questão trabalhista a se superar - a possibilidade de se usar um mesmo concurso para dois regimes diferenciados de trabalho com posterior alocação. Uma opção menos ideal, seria a realização de dois concursos separados e acompanhamento de grupos que sejam socioeconomicamente similares.
Upideite(23/ago/2013): uma análise crítica às propostas de SHH. (via @sibelefausto)
Upideite(01/out/2013): outra crítica às propostas de SHH, da ANPG. (via Cassiana Perez FB)

sábado, 14 de abril de 2012

Qual é o valor do aluno de pós-graduação stricto sensu?*

*Esta postagem faz parte da blogagem coletiva promovida pelo sítio web posgraduando pela valorização dos alunos de pós-graduação.

Antes de mais nada, uma pequena objeção minha, o pessoal do posgraduando restringiu a discussão à situação dos alunos de pós-graduação stricto sensu sob a justificativa: "Outra confusão comum é a diferenciação entre as pós-graduações stricto sensu e lato sensu. Com a recente transformação do ensino superior em mercadoria ocorreu uma explosão de ofertas de cursos de especialização lato sensu, infelizemente nem sempre oferecidos por instituições sérias ou comprometidas com a qualidade de ensino. Como consequência disto surgiu um sério preconceito contra esses cursos, e este preconceito muitas vezes é estendido à pós-graduação de maneira geral." Aparentemente incorporaram os preconceitos contra os pós-graduandos lato sensu.

Adotarei a restrição, no entanto, não pela aceitação de que o lato sensu é de baixa qualidade, mas sim, em reconhecimento de que as situações são distintas. A pós lato sensu é eminentemente voltada para o mercado e a valorização se dá diretamente na carreira dos que fazem tais cursos: como aumento de salário, melhores oportunidades de emprego, networking, etc. A stricto sensu envolve mais a cultura da pesquisa acadêmica, no Brasil e em vários lugares do mundo, restrito ou a instituições públicas ou cujo funcionamento dependa enormemente de verbas públicas para o financiamento.

No Brasil, certamente a dinâmica que envolve a valorização de títulos de mestrado e doutorado stricto sensu não envolve grande participação de mecanismos tipicamente do mercado de trabalho. As IES privadas estão longe de cumprirem a determinação legal de 70% do corpo docente formado por mestres e doutores - e, sempre que possível e necessário, lançam a mão de reduzir seus quadros de professores titulados para diminuir custos.


Assim, faz pouco sentido valorar a pós-graduação a partir de dados mercadológicos: o quanto mestres e doutores recebem mais e são mais procurados do que os que são apenas graduados. Ademais a empregabilidade de doutores no Brasil é bem menor do que a média do mercado de trabalho: quase 30% não trabalham na área em que se especializaram.

Uma saída é recorrer a dados econométricos sobre o quanto os pós-graduandos contribuem para o PIB com seus trabalhos. Isso incluiria até gastos com a impressão da tese, inscrição em congressos, viagens de coleta, etc. O grande porém é: não existem tais dados (pelo menos acho que não, se alguém souber de algum estudo, por favor, dê-me um toque ali nos comentários). Mal há dados sobre o quanto a pesquisa acadêmica se reverte em ganhos econômicos no Brasil: há dados isolados como no caso da Embrapa e programas da Fapesp de fomento à pesquisa nas indústrias - variando entre 6 e 9 vezes o valor investido inicialmente. Os investimentos em P&D no país ficam em torno de 1,2% do PIB (e deve cair este ano), o setor público responde por cerca de 0,64% (ou 53,3% dos investimentos totais). Assim, em uma estimativa bem grosseira, os ganhos resultantes do investimento em pesquisa acadêmica no país fica em torno de 3,84% a 5,76% do PIB (de mais ou menos R$ 4 trilhões) - ou algo como R$ 160 bilhões.

O número de alunos de doutorado deve estar na ordem de 70.000 e de mestrado, 100.000. Considerando a média das IFES de 1,5 aluno de pós-graduação por docente, são cerca de 110.000 docentes registrados em programas de pós-graduação. Se distribuíssemos 10% dos R$ 160 bi em bolsas e salários, seria uma média de R$ 4.700,00 para cada um. Mantendo-se a distribuição proporcional atual: salário docente médio de R$ 4.200,00, bolsa CNPq de doutorado de R$ 1.800,00 e de mestrado de R$ 1.200,00; teríamos: salário docente médio de R$ 7.700; bolsa doutorado de R$ 3.300 e bolsa mestrado de R$ 2.200 como um pagamento mais justo em relação ao que seus trabalhos revertem em desenvolvimento econômico do país.

Upideite(27/set/2012): Suzana Herculano-Houzel faz seu desabafo - a situação da desvalorização das ciências vai além das bolsas de pós-graduação: "Você quer mesmo ser cientista?"

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