Há ainda a ciência legítima que atua, propositadamente, sobre campos imaginários: algumas vezes para servir de exercício didático a respeito dos princípios subjacentes - aclarar a lógica de um mecanismo ou processo analítico.
(Mas explorar as causas profundas desse fenômeno é uma tarefa da psicossociologia das ciências. Desconheço algum trabalho que analise a fundo a necessidade dos cientistas em produzir esse tipo de artigo.)
A quintessência do processo científico é o paper. Quando se fala em conhecimento científico legitimado o ícone é o artigo científico publicado em revista indexada revisado por pares. (É um dos poucos casos em que se fala de autorregulação sem se ouvir tosses dissimuladas, engasgos ou ver narizes torcidos - talvez por não se explicitar que isso significa apenas que é ciência aquilo que os cientistas mesmos dizem que é ciência...) É a medida de produtividade, em cima dele derivam-se os valores bibliométricos e cienciométricos - que irão embasar o mérito de uma pesquisa e de seus pesquisadores.
Nada mais natural então que essa peça central da comunicação (disseminação) científica seja um dos alvos preferenciais da gaiata ciência (com o devido perdão a Nietzsche pela corrutela).
Segue uma coleção de artigos científicos (publicados em revistas científicas ou livros, de outro modo, sérios), falsos artigos científicos (incluindo os publicados em revistas científicas - especialmente os que vão dentro do espírito do 1o de abril) e artigos de natureza intermediária (ou indeterminada):
- Alpher, RA; Bethe, H & Gamow, G. 1948. The origin of chemical elements. Physical Review 73(7): 803-4. A brincadeira é mais sutil, apenas com os sobrenomes dos autores: o trabalho foi de Gamow e de seu aluno Alpher, para o trocadilho, Gamow convidou Hans Bethe para ficar alfa-beta-gama. (Comentário no Humor na Ciência.)
- Carpenter, K. 1998. A dinosaur paleontologist's view of Godzilla. In Lees, JD & Cerasini, M. (eds) The Official Godzilla Compendium. Random House (New York), pp. 102-106. (Uma análise no Tetrapod Zoology.)
- Christiansen, P. 2000. Godzilla from a zoological perspective. Mathematical Geology 32: 231-245.
- Craig, JM; Dow, R & Aitken M-A. 2005. Harry Potter and the recessive allele. Nature 436: 776a (Carta que valeu uma resposta de Dodd, A; Hotta, CT & Gardner, MJ. 2005. Harry Potter and the prisoner of presumption. Nature 437: 318.) (Comentário no Via Gene.) Sim, Hotta, CT é o Carlos Takeshi Hotta do Brontossauros em meu jardim.
- Georgy, ST & Widdicombe, JG. 2002. The pyrophysiology and sexuality of dragons. Respiratory Physiology & Neurobiology 133(1-2):3-10. (Brincadeira de 1o de abril publicada em 11 de outubro.)
- Gould, SJ. 1979. Mickey Mouse meets Konrad Lorenz. Natural History 88:30-36. (Gould discute a neotenia na evolução gráfica da personagem de Disney. A referência a Lorenz é o conceito do "Kindchenschema" atributos físicos de filhotes de mamíferos - como cabeça e olhos grandes e arredondados - que despertam sentimentos de proteção nos humanos adultos.)
- Hassani, S. 2005. Santa Claus and the conservation of energy. Phys. Edu. 40: 579-81.
- Höfer, T; Przyrembel, H & Verleger, S. 2004. New evidence for the Theory of the Stork. Paediatric and Perinatal Epidemiology 18(1): 88-92.
- Krugman, P. 1978. Theory of interstellar trade. (O nobelista de economia em 2008 Paul Krugman.)
- Lawton JH . (1996). Nessiteras rhombopteryx. Oikos 77:378-380
- Munz, P; Hudea, I; Imad, J & Smith?, RJ. 2009. When zombies attack!: mathematical modelling of an outbreak of zombie infection. In JM Tchuenche & C Chiyaka (eds) Infectious disease modelling research progress. Nova Science Publishers, no prelo. (Uma análise no RNAm, entrevista com Smith? no Universo Físico.)
- Phillips, PK & Heath, JE. 2001. Heat loss in Dumbo: a theoretical approach. Journal of Thermal Biology 26(2): 117-20.
- Pittenger, JB. 1983. On the plausibility of Superman's x-ray vision. Perception 12(5): 635–9.
- Ragan, SM. 2005. Etiology of Romero-Fulci disease: the case for prions. J. Zom. Sci 6:1519-23. (Artigo de ficção.)
- Sheldon, RW & Kerr, SR. 1972. The population density of monsters in Loch Ness. Limnology & Oceanography 17(5): 796-8.
- Tippet, Ben. 2009. A unified theory of Superman's power. (Uma análise no 100nexos.)
Upideite(15/mar/2011): Parte 2, a missão.
2 comentários:
Excelente compilação Takata! Tem até minha humilde contribuição ao mundo da ciência falsa! Eu ainda hei de screver um paper sobre as vacas mágicas cujo leite é explicação de existirem bruxos no mundo do Harry Potter!
Obrigado pela visita e comentário, Hotta.
Não se esqueça de avisar assim que seu artigo sobre magia láctea sair.
(Uma vez fiz um artigo sobre a posição filogenética do ET de Varginha. Tinha um colega meu de faculdade q editava revistas científicas fakes, publiquei em um dos títulos: sim, havia mais de um.)
[]s,
Roberto Takata
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