Lives de Ciência

Veja calendário das lives de ciência.

sábado, 31 de dezembro de 2011

Gene Repórter ano 4: resposta do enigma

Eis a resposta ao enigma do concurso cultural dos três anos do Gene Repórter.

Os caracteres correspondem aos símbolos chineses para os elementos da tabela periódica. Os símbolos em alfabeto latino correspondem a uma aproximação de "Barbara McClintock", botânica americana ganhadora do prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1983 por sua descoberta de elementos genéticos móveis, os transposons.

Upideite(05/jan/2012): O vencedor é Ricardo Kossatz do Lógica Mente. O prêmio já foi despachado. Agradeço a participação de todos.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Um supercomputador distribuído para o Brasil

Mais uma proposta para um projeto. Não tem todos os detalhamentos necessários para ser chamado de projeto, mas apenas uma ideia geral para ser desenvolvida.

No Brasil temos atualmente mais de 100 mil lan houses (que fornecem acesso à internet para 32 milhões de usuários). Boa parte delas em situação informal (somente cerca de 13% são formalizadas), com uma média de 6 a 10 computadores cada - provendo cerca de 400 horas semanais de acesso.

Agora, imaginemos que consigamos um índice de formalização de 50%. Serão 300-500 mil computadores. Sigamos imaginando. Agora que cada um desses terminais tenha instalado um software de computação distribuída no estilo BOINC - formaria uma rede de tamanho equivalente. O projeto BOINC tem uma respeitável capacidade de processamento de 5,3 petaflops. O supercomputador mais poderoso operando no Brasil tem capacidade de 258 teraflops.

Agreguemos à essa rede os computadores comprados com verbas federais destinados ao ensino e à pesquisa. Só o programa Um Computador por Aluno licitou 150 mil máquinas. É possível que se possa ultrapassar a marca dos 8,2 petaflops do K Computer - o mais rápido supercomputador até o momento.

A instalação dos softwares em terminais de lan houses poderia ser exigida como condição de formalização - e não traria maior custo aos proprietários - e, nos computadores adquiridos por verbas federais, os programas poderiam ser instalados como condição do edital.

Parceriais com governos estaduais e municipais poderiam ampliar ainda mais a base da rede.

Upideite(05/jan/2012): Há, no entanto, uma limitação relativamente séria - localizado quase que exclusivamente em território nacional, tal supercomputador teria uma janela diária de funcionamento limitado a cerca de 8 a 10 horas (alguns equipamentos poderiam permanecer 24 horas funcionando, mas longe de fornecer, em conjunto, uma capacidade significativamente grande de processamento).

Upideite(22/jun/2016): Desde então as lan houses passaram por uma crise, fechando um grande número delas. Dos 100 mil estimados em 2011, em 2013 eram 60 mil. Com as ascensão dos smartphones no acesso à internet, talvez sua base possa substituir, ainda que parcialmente, a perda da base de lan houses, por meio de aplicativos de ciência cidadã ou mesmo de  jogos puros.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Supernova dá pistas sobre como surge o sensacionalismo

Sites noticiosos brasileiro reproduzem notícia da BBC Brasil.

Explosão de supernova dá pistas sobre formação da vida
"A explosão de uma estrela supernova em uma galáxia a 21 milhões de anos-luz deu a cientistas um raro vislumbre de como a explosão de estrelas pode gerar vida no universo. Astrônomos capturaram as imagens da explosão da supernova SN2011fe, na galáxia Cata-vento na constelação de Ursa Maior, apenas 11 horas depois do evento."

Quem lê a manchete e o primeiro parágrafo vai imaginar que a vida surgiu por algum processo relacionado à explosão de uma estrela de modo mais direto. Seria que a energia liberada catalisaria as reações químicas que levaram à emergência da vida?

Nada disso. Na verdade não tem nada a ver com a vida. Tem a ver com a *dispersão* de *elementos químicos* mais pesados do que carbono: oxigênio, magnésio, silício, cálcio e ferro. Não se trata nem ao menos da formação de monômeros (como aminoácidos, nucleotídeos e açúcares) que formam as macromoléculas orgânicas.

Sim, oxigênio e ferro são fundamentais para a vida como a conhecemos aqui na Terra. Mas sua simples presença, pelo que sabemos, passa longe de ser o suficiente para a formação de seres vivos.

O site do jornal inglês The Guardian foi mais comedido:

Supernova explosion gives a glimpse of how ingredients for life are created ["Explosão de supernova dá pistas sobre como ingredientes da vida foram formados."]

Mas também poderiam ter dito: "pistas sobre como ingredientes da ferrugem foram formados". Menos chamativo, mas menos errado - e se optam pelo que é mais chamativo em detrimento da correção podemos chamar de sensacionalismo, não? (Menos errado porque ainda assim estaria errado: o trabalho não diz como os elementos se formam, mas como se espalham. A formação dos elementos ocorre no intervalo de fração de segundos após o início da explosão. 11 horas depois - que são o tempo a que se referem os dados analisados - os elementos já estão formados há... 11 horas.) O que podemos dizer então da versão do título da matéria da BBC Brasil?

Vejamos o contraste entre o que é sugerido (ou afirmado) no título com o que é reportado de fato: "Com o tempo estes elementos vão se transformar nos blocos de construção de novos sistemas solares e, possivelmente, de seus habitantes vivos." ("Possivelmente"? Bem menos assertivos.)

O achado não dá pista nenhuma sobre a formação da vida. Já se sabia que supernovas eram a fonte de átomos mais pesados. E que átomos mais pesados são necessários para a construção de formas de vida como a nossa. A novidade é que se detalha mais como esses elementos (formados durante a própria explosão) espalham-se - já que se pôde obter dados pouco tempo após a explosão: 11 horas de intervalo (atenção! não quer dizer que a estrela observada explodiu há apenas 11 horas do início da coleta dos dados - quer dizer que foram capturadas ondas eletromagnéticas geradas 11 horas após a explosão, que se deu uns 21 milhões de anos atrás). E saber como ferro e oxigênio se espalham não nos esclarece em nada (ou quase nada) como a vida surge da combinação dos elementos químicos - a vida poderia ter surgido a partir desses elementos independentemente da origem de tais elementos. Se carbono, oxigênio, etc. sintetizados, digamos pela decomposição térmica de madeira, fossem dispostos nas condições (ainda desconhecidas) que levaram à origem da vida na Terra, isso deveria levar ao surgimento da vida com a mesma probabilidade de que carbono, oxigênio, etc. liberados e sintetizados na explosão da supernova nessas condições levariam (salvo talvez pela composição isotópica original).

Este blogue começou com uma postagem sobre o sensacionalismo que se faz nesses anúncios de resultados referentes à astrobiologia, e desde então diversas outras vezes o mesmo erro tem sido cometido - muitas vezes por indução dos próprios cientistas, mas com colaboração dos jornalistas que parecem ávidos por esse tipo de declaração e não costumam questioná-los.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Especulando: E se o processo de submissão de artigos às revistas fosse unificado?

Conversando com a Lucia Malla e Carlos Hotta pelo twitter a respeito da submissão e análise de artigos científicos pensei em modo de racionalizar um pouco esse trabalho.

Na verdade é algo bastante improvável de ser posto em prática, daí ser mais especulação do que propriamente uma proposta.

Embora as ferramentas online tenham barateado em muito o processo - eliminando os custos de postagens de toda a papelada - e programas de gerenciamento (também online) de submissão e análise ajudem em muito a tarefa do editor em organizar tudo isso, o fator tempo ainda não foi de todo eliminado.

Os revisores precisam ler o artigo com cuidado, consultar a bibliografia, eventualmente refazer as contas e tudo isso enquanto ele mesmo tem que cuidar de seus afazeres: pesquisar, atender seus alunos de iniciação e pós-graduação, participar de congressos, preparar e ministrar aulas, escrever projetos, preencher pedidos de bolsas e de financiamento, participar de congressos e conselhos, etc., etc. (sem falar da própria vida pessoal). Pode levar alguns meses entre indas e vindas de versões do artigo até a resposta final: rejeição ou aceite.

No caso de aceite, ótimo, hora de estourar a champanha. Caso o artigo seja rejeitado - depois de corrigir os problemas apontados -, os autores precisam buscar outro periódico e haverá a repetição de todas as etapas. A taxa de rejeição de revistas consideradas de primeira linha é de 90 a 95% dos artigos submetidos. Mas muitos são rejeitados antes mesmo de serem levados à revisão pelos pares: pode ser por inadequação temática ou até mesmo por não estar na formatação correta ou estourar o limite de tamanho.

Com uma taxa de rejeição de 90%, um artigo, em média, receberia cerca de 10 rejeições antes de ser aceito. Com uma taxa de 70%, cerca de 3 rejeições. Mesmo uma taxa de 45% (a menor analisada por Björk & Holmström 2006), levaria a uma média de 1,8 rejeição por artigo antes de ser aceito. Na edição da Nature de 01/dez/2011, a média do tempo entre a submissão e o aceite dos artigos publicados foi de 207±105 dias - na análise de Björk & Holmström 2006, o atraso de publicação variou de 7,6 a 21,8 meses.

Por outro lado, com boa razão, a submissão simultânea do mesmo artigo a mais de uma revista é considerada uma prática condenável. Isso pode levar à multiplicação da publicação de um mesmo artigo, além de levar a trabalhos desnecessários de revisão.

O que pensei foi em um sistema unificado de submissão e avaliação. Os autores enviariam o artigo uma única vez. Assinalando em quais revistas gostaria de publicar bem como a ordem de preferência entre elas. O artigo seria analisado por uma única banca de revisores. Os editores das revistas assinaladas teriam acesso aos relatórios dos revisores e atribuiriam uma nota ao artigo indicando o quão adequado ele é à sua publicação. As notas dos editores seriam ponderadas de acordo com a ordem de preferência dos autores, a maior nota ponderada seria então da revista na qual o artigo seria publicado.

Naturalmente, para evitar conflitos, as notas do editores e a ordem de preferência dos autores seriam sigilosas.

Não é um sistema imune a falhas, claro. Talvez um ponto de discórdia possível seria quanto à escolha dos revisores que satisfizesse a todos os editores. Outro ponto que geraria problemas é em relação ao tamanho dos artigos. Mas autores e editores sempre poderiam optar por uma revisão em separado - voltando ao sistema atual.

A Figura 1 é adaptada de Björk & Holmström 2006, mostrando os aspectos que os autores devem considerar na hora de escolher uma revista para a submissão. Em amarelo, destaco os itens que seriam eliminados em um sistema unificado.

Figura 1. Fatores de decisão para escolha de publicação para submissão de artigo científico.

Referência
Björk, B., & Holmström, J. (2006). Benchmarking scientific journals from the submitting author's viewpoint. Learned Publishing, 19 (2), 147-155 DOI: 10.1087/095315106776387002

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Gene Repórter ano 4

Dia 27 de novembro próximo, este blogue completará 3 anos de atividades.

Como de praxe, terá um concurso cultural, o que, claro, significa que haverá uma premiação.

Quem quiser concorrer a um DVD importado "Best of Beakman's World", basta decifrar o enigma abaixo (leia as dicas mais abaixo) e enviar sua resposta pelo formulário ainda mais mais abaixo (atenção para o regulamento que está ainda mais mais mais abaixo) - leva quem responder corretamente por primeiro.

Decifre o enigma:


Dicão 1: Sim, são caracteres chineses.
Dicão 2: Não, não é uma expressão chinesa (e nem se trata de uma transliteração fonética).
Dicão 3: Símbolos de mesma cor apresentam propriedades similares.
Dicão 4: Elementar, meu caro Watson.



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Regulamento:
0. Somente concorrerão os que enviarem formulários corretamente preenchidos.
1. Parentes meus até segundo grau não valem.
2. A resposta deve ser enviada até às 23h59 (hora de Brasília) do dia 31/12/2011. (Vale o "timestamp" do sistema.)
3. Em havendo mais de uma pessoa que houver respondido corretamente, leva quem tiver respondido antes.
4. O prêmio será enviado gratuitamente, mas somente para um endereço coberto pelos Correios brasileiros em porte nacional.
5. O vencedor ou a vencedora será contatado/a por email e terá uma semana para responder. Findo o prazo, o prêmio estará prescrito e o segundo colocado será contatado. (E assim por diante.)
6. Pode-se responder ao formulário quantas vezes quiser, mas o participante estará concorrendo apenas com o último enviado.
7. Caso não haja nenhum acertador entre os que enviaram a resposta dentro do prazo, o prêmio será sorteado entre todos os concorrentes.
8. Este concurso segue a lei federal 5.768/1971 e legislação correlata.
9. Ocasionalmente o prêmio poderá ser alterado (em comum acordo com o/a ganhador/a) e trocado por um de valor equivalente em casos de indisponibilidade no fornecedor ou por desejo do/a ganhador/a.
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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Yo no creo en brujas...

...y que no las hay, no las hay. Mas hoje é Dia do Saci e Dia da Noite das Bruxas. Segue uma compilação temática GR faunística para celebrar as efemérides.

Morcegos vampiros. São três espécies. O vampiro comum (Desmodus rotundus), o de perna-peluda (Diphylla ecaudata) e de asas-brancas (Diaemus youngi), todos de ocorrência neotropical e formando um grupo monofilético (todos têm um mesmo ancestral em comum exclusivo entre as espécies conhecidas de morcego atuais), Desmodontinae. Pertencem à família Phyllostomidae, a mais diversas da ordem Chiroptera, que apresenta uma ampla variedade de hábitos alimentares entre seus membros. A hematofagia parece ter se desenvolvido a partir de ancestrais insetívoros. Um modelo evolutivo para a evolução do hábito de se alimentar de sangue de mamíferos (De. rotundus e Dia. youngi) e de aves (Dip. ecaudata) podem ser aves bufagídeas, que se alimentam de carrapato nas savanas africanas - elas se alimentam não apenas de carrapatos, mas também do próprio sangue dos hospedeiros.

Há um morcego da espécie Vampyrum spectrum, morcego espectral, cujos indivíduos curiosamente não se alimentam de sangue - são carnívoros, caçando roedores, aves e até outros morcegos.

Tentilhão vampiro ("vampire finch") - Geospiza difficilis septentrionalis. Indivíduos desta subespécie ocasionalmente alimentam-se de sangue de aves marinhas - que escorrem de feridas provocadas pelo próprio tentilhão. Elas se alimentam também de insetos parasitas como no caso dos bufagídeos mencionados acima.

Lula-vampiro (Vampyroteuthis infernalis). Não é um sugador de sangue. Seu nome é inspirado na aparência algo morcegosa - com membranas que se estendem por entre os tentáculos.

Peixe-bruxa ou feiticeira (várias espécies de agnatos do grupo Myxini). Alimentam-se de animais mortos ou moribundos*. Não possuem mandíbulas ou coluna vertebral, mas têm notocorda e crânio. Têm também dentes córneos que usam para arrancar pedaços de carne das carcaças. Vivem no fundo dos oceanos de todo o globo - exceto nas regiões polares.

Tubarão-gnomo ou tubarão-duende (Mitsukurina owstoni), seu nome em inglês é mais amedrontador: goblin shark. Vivem em águas com profundidade de cerca de 250 m ou mais alimentando-se de peixes, moluscos e crustáceos, localizando-os com a ajuda de uma espátula eletrossensível que se projeta acima de suas maxilas superiores e lhe confere sua aparência distinta.

Diabo-da-tasmânia (Sarcophilus harrisii), marsupial carnívoro da... sim, Tasmânia. Caçado por ser tido como ameaça aos animais de criação, passou a ser considerado sob ameaça de extinção e, desde 1941, está sob proteção oficial. Mas a partir de 1990, um tumor facial transmissível tem levado a uma drástica redução do tamanho da população.

Siri-fantasma (espécies do gênero Ocypode), também conhecido como maria-farinha - ambas as denominações populares pela coloração clara.

Um anfíbio fóssil foi batizado de Eucritta melanolimnetes, grego latinizado para 'monstro da lagoa negra'. A criatura é do Carbonífero escocês, não, infelizmente, da região amazônica.

Um dinossauriforme descoberto em Agudos-RS ganhou o nome de Sacisaurus agudoensis pelo fato de apenas um dos fêmures ter sido recuperado (seria mais engraçado se tivesse sido o esquerdo), junto com fragmentos de outras partes do corpo.

*Upideite(02/nov/2011): Mas podem ser caçadores ativos também. (Via Samir Elian no G+)

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Barriga da fortuna: uma paráfrase a Tolstoi

"Все счастливые семьи похожи друг на друга,
каждая несчастливая семья несчастлива по-своему."
["Todas as famílias felizes são parecidas,
já as famílias infelizes são cada qual infelizes a seu modo."]
Leo Tosltoi
Anna Karenina

Esta postagem era para ser parte do Blog Action Day (que tem o terrível acrônimo: BAD) em comemoração ao Dia Mundial da Alimentação (16 de outubro, data da fundação da FAO), mas por motivos diversos acabou por não ficar pronta a tempo.

O acesso aos alimentos e o estilo de alimentação (comida mais rica ou menos rica em carboidratos e gorduras, p.e.) certamente são fatores importantes (embora não os únicos, fatores genéticos e o estilo de vida: sedentarismo x atividade física, p.e.) na determinação do IMC.

Na Figura 1 estão plotados a prevalência na população de pessoas com sobrepeso/obesidade (IMC igual ou acima de 25) e com subpeso/magreza excessiva (IMC abaixo de 18,5) pelo PIB per capita (em paridade de poder de compra, PPP): nota, os valores compilados variam de 1985 a 2009 (tanto quanto possível busquei os valores mais recentes disponíveis para os países no Banco de Dados Mundial de IMC da OMS, com os valores de PIB per capita dos anos correspondentes disponíveis no Economy Watch e no index mundi).

Figura 1. IMC x PIB per capita. Sobrepeso/obesidade (IMC ≥ 25),
subpeso/magreza excessiva (< 18,5).

Na Figura 2 é apresentada a relação entre PIB per capita e a prevalência de IMC normal (abaixo de 25 e igual ou acima de 18,5).

Figura 2. Prevalência de IMC normal (≥ 18,5 e < 25) x PIB per capita nos países.

Em relação à magreza excessiva (fortemente associada à subnutrição), a riqueza tem uma relação bastante forte: em países com renda mais alta, há poucos casos de IMC abaixo de 18,5. O que não significa que países com renda mais baixa apresentem menos casos de IMC acima do grau de sobrepeso e obesidade, quase que ao contrário, os maiores índices de prevalência de sobrepeso/obesidade tendem a ser encontrados em países mais pobres (bem como os maiores índices de prevalência de subpeso).

Na verdade, ocorre uma maior dispersão dos valores de IMC entre os países com PIB per capita mais baixo (e uma menor dispersão entre os países com PIB per capita mais elevados). Os EUA, sempre citados quando se fala em epidemia de obesidade, são um ponto fora da curva: para países com alta renda, os valores de IMC na faixa do sobrepeso/obesidade parece tender a um valor em torno de 10%.

Quando se analisa o gráfico de prevalência de IMC na faixa da normalidade, essa tendência a valores intermediários aparece mais claramente - mas isso entre *países*. E *dentro* de cada país? Usando o índice de Shannon (na verdade, um pseudoíndice - não ajustei para ln 2, de modo que não correspondem a bits) para os valores de prevalência de IMC de subpeso/magreza excessiva, normalidade, sobrepeso/obesidade, temos o gráfico da Figura 3, em que, novamente, vemos que países mais ricos tendem a se parecer mais entre si, mas não necessariamente países mais ricos são internamente mais homogêneos (eles são relativamente heterogêneos, como um alto índice de Shannon mostra).

Figura 3. Índice de Shannon da prevalência de três classes de IMC (sobrepeso/obesidade, normalidade, subpeso/magreza excessiva) x PIB per capita.

A explicação desses padrões não deve ser muito simples. Em países mais ricos, de modo geral, há uma maior abundância de alimentos, sobretudo os mais energéticos; mas também há mais acesso a educação alimentar e mesmo a tratamentos contra a obesidade e magreza. Há ainda que se levar em conta a questão da distribuição de renda. Além disso, famílias pobres podem ter acesso a uma boa alimentação se tiverem espaço para cultivar seu próprio alimento (em terreno suficientemente fértil e não forem assoladas por pragas e instabilidades climático-meteorológicas). Na África subsaariana não se observam países pobres com alta prevalência de obesidade, ao contrário do que pode ocorrer em países do Mediterrâneo Oriental e do Pacífico Ocidental - serão fatores genéticos? culturais? ambos?

Mas creio que possamos dizer (com o devido pedido de desculpas a Tolstoi), em relação à obesidade/magreza e a riqueza, que todos os países ricos se parecem, enquanto que nos pobres há obesos e magros cada qual a sua maneira.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

O que o Google nos diz sobre a interesse do brasileiro em ciência?

Voltando à ferramenta do Google Trends, podemos comparar os temas incluídos na pesquisa sobre Percepção Pública de Ciências do MCTI.

Algumas notas de precaução: O universo é distinto, a pesquisa do MCTI inclui uma amostra representativa de todos os brasileiros com 16 anos ou mais; o Google Trends inclui apenas os brasileiros com acesso à internet (por volta de 74 milhões em março de 2011; sendo em torno de 145 milhões os brasileiros com 15 anos ou mais em 2010) e, claro, que usaram o sistema de buscas da empresa (creio que se aproxime dos 100% dos usuários brasileiros de internet). E a motivação da busca não envolve apenas interesse/afinidade pessoal - as buscas podem se dar (e parece ser bem o caso de termos relacionados às ciências), p.e., para resolução de tarefas escolares e outras necessidades.

Mas as figuras abaixo comparam as buscas por 'ciência' e outros termos.


Para fins de comparação, em 2010, para a pesquisa do MCTI, os brasileiros responderam ter interesse ('muito interessado' ou '' interessado') por (entre parênteses o índice relativo de volume de buscas):
meio ambiente: 83% (3,30);
medicina e saúde: 81% (medicina - 4,40, saúde - 5,50);
religião: 74% (1,10);
economia: 71% (3,90);
ciência e tecnologia: 65% (1 - ciência, 3,50 - tecnologia);
esportes: 62% (16,5);
arte e cultura: 59% (arte - 7,00, cultura - 8,70);
moda: 44% (6,80);
política: 29% (1,40);

O gráfico abaixo plota os dados sobre o interesse declarado contra o volume de buscas sobre os temas. O ponto em vermelho corresponde à C&T (usando um valor médio para o índice de volume de busca entre ciência e tecnologia).


Não há nenhum padrão óbvio. Mas aparentemente valores intermediários de interesse declarado ligam-se a um maior volume de busca. Se esse padrão não for um artefato, uma explicação possível é que temas de grande interesse geram uma saturação de informação, diminuindo a busca ativa por mais detalhes; enquanto temas de baixo interesse não geram motivação para a busca.

Mas digno de nota que todos os temas apresentam um volume de busca maior do que o termo 'ciência' (ou 'ciências'). É de se perguntar se parte significativa do interesse declarado no quesito 'ciência e tecnologia' na pesquisa do MCTI não se refere mais à parte de 'tecnologia'.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Nem tudo que doureja é lúzio 3

Um pouco mais da gaiata ciência.
  • Cyr, C. & Lanthier, L. 2007. One giant leap for mankind? A cost-utility of abolishing the law of gravity. (Um estudo sobre o quanto seria economizado em saúde se por uma simples canetada fosse possível diminuir a intensidade do campo gravitacional terrestre. Inspirado por uma proposta galhofa do Neo Rhino Party do Canadá - sim, eles têm o Cacareco deles.) (via @Cardoso)
  • Dickison, M.R. 2009? Paedomorphic flightlessness and taxonomic affinities of a enormous Recent bird of What, if anything, is Big Bird?
  • (Afinal, qual a afinidade taxonômica de Garibaldo (Grandicrocavis viasesamensis)?) (via @john_s_wilkins)

  • Kamp, M.A.; Slotty, P.; Sarikaya-Seiwert,S.; Steiger, H.J. & Hänggi, D. 2011. Traumatic brain injuries in illustrated literature: experience from a series of over 700 head injuries in the Asterix comic books. Acta Neurochir (Wien) 153(6):1351-5. (Uma análise de golpes na cabeça em 34 livros dos valentes gauleses de Goscinny e Uderzo e os fatores de riscos associados à severidade dos traumas.) (via @carlosom71)
  • Hurlber, S.H. 1990. Spatial Distribution of the Montane Unicorn. Oikos 58(3): 257-71. (Populações da fictícia espécie recém-descoberta do unicórnio de Montana - Monoceros montanus - serve como base para uma crítica a respeito dos critérios analíticos usados na caracterização da distribuição espacial de organismos.)
  • Johnsgard, P.A. & Jonsgard, K. 1992. Dragons & Unicorn: A Natural History. St. Martin Press. 76 pp. (Professor emérito em Ciências Biológicas da Universidade de Nebraska em Lincoln, Paul Jonsgard traça no livro toda a história natural - biologia, anatomia, ecologia e evolução - de dragões e unicórnios.)
  • Sandvik, H. & Baerheim, A. 1994. [Does garlic protect against vampires? An experimental study]. Tidsskr Nor Laegeforen 114(30): 3.583-6. (Artigo em norueguês sobre o efeito do alho na ação de sanguessugas, que foram usadas no lugar de vampiros. Infelizmente o tamanho amostral - n = 3 - é bem pequeno.. (via @scienceblogsbr e astropt)

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Ciência: coisa de criança?

Interessantes as similaridades dos padrões temporais de pesquisa na internet por 'ciência' no Brasil (Fig. 1) e 'science' nos EUA (Fig. 2). Os gráficos abaixo foram obtidos pelo Google Trends.

Parece haver uma tendência de queda geral na busca por 'ciência' ou 'science' e a intensidade de pesquisa é fortemente influenciada pelas férias escolares: sofrendo uma forte depressão nas férias de inverno e de verão (especialmente nas de verão, mais prolongadas - entre dezembro e fevereiro no Brasil e entre fim de maio e meados de agosto nos EUA).

Figura 1. Padrão de pesquisa pelo termo 'ciência' no Google a partir do Brasil.

Figura 2. Padrão de pesquisa pelo termo 'science' no Google a partir dos EUA.

Tanto no Brasil como nos EUA, não são os estados particularmente mais populosos e economicamente significativos que se destacam nas buscas.

Será que o padrão é gerado por trabalhos escolares encomendados aos alunos?

Em Portugal, essa distribuição não é tão evidente (Fig. 3).
Figura 3. Padrão de pesquisa pelo termo 'ciência' no Google a partir de Portugal.

Outros termos relacionados a disciplinas escolares, como 'matemática', 'biologia' e 'geografia', seguem o mesmo padrão (Figs. 4a-c).

a)b)c)
Figura 4. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'matemática', (b) 'biologia' e (c) 'geografia' no Google a partir do Brasil.

Muitos termos não relacionados a disciplinas escolares apresentam padrões diferentes. Como o caso de novela, futebol e viagem (neste último caso, o padrão é o inverso - picos de busca justamente nos períodos de férias escolares) (Figs. 5a-c). Mas 'economia', segue o padrão de redução de buscas nas férias (Fig. 5d).

a) b)
c) d)
Figura 5. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'novela', (b) 'futebol', (c) 'viagem' e (d) 'economia' no Google a partir do Brasil.

Como férias escolares coincidem com férias letivas no ensino superior, isso pode explicar o padrão de 'economia' condizem com o de disciplinas do ensino básico. Termos 'TCC' e 'direito' (Figs. 6a-b) apresentam a mesma distribuição de frequência de buscas.


a) b)
Figura 6. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'TCC' e (b) 'direito' no Google a partir do Brasil.

Alguns termos científicos mais específicos, como 'DNA', 'nanotecnologia', 'aquecimento global', 'transgênicos' (Figs. 7a-d), seguindo igual tendência, parecem indicar que suas buscas são motivadas por trabalhos escolares/acadêmicos. O caso de 'transgênicos' é ainda mais extremado - caindo a zero durante o período de férias. O grande momento da pesquisa sobre 'aquecimento global' foi em 2007, quando houve o relatório do 4o IPCC em que se chegou ao amplo consenso científico sobre o 'aquecimento global antropogênico' e houve grande cobertura midiática.

a) b)
c) d)
Figura 7. Padrão de pesquisa pelos termos (a) 'DNA', (b) 'nanotecnologia', (c) 'aquecimento global' e (d) 'transgênicos' no Google a partir do Brasil.

Esses resultados podem indicar que não devemos ser tão otimistas com resultadosdados de pesquisa de opinião que descrevem o brasileiro como interessado em ciências. Mesmo que o universo dos que têm acesso regular à internet e saibam usar os mecanismos de busca seja restrito, entre esses - em geral com melhores condições socioeconômicas - o interesse parece se resumir a resolver tarefas escolares. Termos como 'novelas' e 'futebol' mostram que, quando há interesse, os internautas brasileiros sabem como buscar mais informações (ou ao menos tentar encontrá-las).

Uma ampla cobertura midiática, sem surpresas, afeta o interesse das pessoas em obter informações mais detalhadas.

A tendência geral de queda das buscas por temas ligados às ciências talvez se deva a uma modificação demográfica das pessoas que acessam a internet, com uma diluição da fração de acadêmicos e estudantes (por favor, não falem em orkutização... ops!).

Alguém a fim de fazer um levantamento mais sistemático e aprofundado sobre o tema? (Deve valer pelo menos um TCC.)

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

(Des)conexões: Poesia, arte, ciência e matemática

"Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte"
Luís de Camões
Os Lusíadas, Canto I

O Institute for Figuring, também conhecido como fig. ou pela sigla inglesa IFF, é uma organização sediada em Los Angeles, Ca., EUA, que tem como objetivo divulgar e desenvolver a expressão de conceitos matemáticos e científicos por meio da poesia e de elementos estéticos através de palestras, publicações e exposições.

Conheci por acaso, buscando informações sobre os crochês hiperbólicos de Daina Taimina (fig. 1). Ela desenvolveu-os em 1997 quando dava aula de matemática na Universidade de Cornell a fim de ilustrar de modo concreto as propriedades de um espaço não-euclidiano hiperbólico - de difícil representação tridimensional. (E a obra de Taimina conheci através do livro: "Alex no país dos números: uma viagem ao mundo marvilhoso da matemática" de Alex Bellos, 2009, Cia. das Letras, 490.)

Figura 1. Um crochê hiperbólico de Dainia Taimina. Foto: Stitchlily.

Buscava mais informações não apenas por curiosidade pessoal, mas também para ajudar um amigo meu, Manuel Bulcão, que mantém (entre outras atividades) um blogue que versa exatamente sobre a relação entre ciência e arte: A Arte do Conceito.

Arte e ciência foi também tema abordado no encontro promovido pela revista Trip entre o neurocientista Miguel Nicolelis e o coordenador do Projeto Axé, Cesare La Rocca - ambos homenageados pela publicação no Prêmio Transformadores 2011.

Ciência e arte encontram-se também no termo grego τέχνη 'techné': significando tanto arte quanto ciência aplicada. Raiz de técnica e tecnologia.

E, claro, nas ilustrações científicas. Pra quem gosta, vale a pena visitar o blogue Symbiartic de Kalliopi Monoyios.

Sem falar em fotografias, design, engenharia, infografias, paleografia, neurobiologia da arte, ou, mais recentemente, arte genômica*. Impossível esgotar os detalhes de todas as imbricações em uma única postagem - ou mesmo em uma série.

*Upideite(17/set/2011): A lista é quase interminável, mas eu não poderia deixar de mencionar outra área de encontro: dança interpretativa de teses de doutoramento.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O brasileiro está mais interessado em Ciência e Tecnologia? - MCTI responde

Perguntei ao ouvidor do MCTI a respeito da interpretação de que o brasileiro está mais interessado em C&T, minha mensagem foi repassada ao chefe do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do ministério, Prof. Dr. Ildeu de Castro Moreira, que gentilmente respondeu.

Segue abaixo a troca de mensagens:
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-------- Mensagem original --------
Assunto: Ouvidoria MCT - Sugestão
Data: Mon, 22 Aug 2011 01:40:28 -0300 (BRT)
De: ouvidoria@mct.gov.br
Para: ouvidoria@mct.gov.br

Senhor Ouvidor, a seguinte mensagem foi postada pela Ouvidoria do Site do MCT:
Ocorrência Nº.: xxx
E-mail: rmtakata@xxx
Mensagem: Na verdade é uma dúvida. Em relação às pesquisas Percepção Pública da Ciência e Tecnologia de 2006 e de 2010, noto que nos relatórios, a codificação para a pergunta a respeito do interesse dos entrevistados é diferente.

Na de 2006, são apresentadas apenas as categorias: muito interesse, pouco interesse e nenhum interesse (além de não respondeu/não sabe).

Na de 2010: muito interessado, interessado, pouco interessado e não tem interesse (e ns/nr).

Houve mudança na formulação da questão?

Cordialmente,

Roberto Takata
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Date: Mon, 22 Aug 2011 09:50:46 -0300
From: icmoreira@xxx
To: rmtakata@xxx
CC: ouvidoria@mct.gov.br
Subject: enquetes

Prezado Roberto,

Obrigado por sua mensagem.
De fato alteramos as categorias (passando de 3 para 4) em 2 questões da enquete, depois de alguma discussão entre especialistas, para poder fazer comparações com questões similares de outros países e também porque o menu de respostas fica mais "equilibrado". Claro que isto dificulta a comparação com a enqute de 2006, mas esperamos que as próximas mantenham a estrutura de 2010 para possibilitar uma comparação mais precisa.

Um abraço
Ildeu Moreira
Diretor Depdi/Secis
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação

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From: rmtakata@xxx
To: icmoreira@xxx
Subject: RE: enquetes
Date: Mon, 22 Aug 2011 12:12:59 -0300

Prezado Prof. Dr. Ildeu Moreira,

Grato pela informação. É que algumas notícias divulgadas, e parece que era a interpretação do próprio MCT, relatavam um aumento (e expressivo) no interesse do brasileiro por C&T(e outros temas - exceto política). Eu creio que tenha sido um efeito da alteração das categorias (fiz uma ligeira análise e publiquei em meu blogue: http://genereporter.blogspot.com/2011/08/o-brasileiro-esta-mais-interessado-em.html).

A próxima pesquisa será em 2014?

Agradeço mais uma vez a informação e a atenção.

Cordialmente,

Roberto Takata

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Date: Mon, 22 Aug 2011 13:51:08 -0300
From: icmoreira@xxx
To: rmtakata@xxx
Subject: Re: RE: enquetes

Roberto

Esta foi uma falha decorrente da tabulação que uma pessoa do MCT fez qdo fazia os gráfico comparativos. Tirei fora estes slides, mas eles já haviam circulado e conduziram a esta interpretação errônea. De fato, o interesse, que é grande variou pouco. Nesta questão específica, a diferença mais significativa foi o crescimento do interesse pela questão ambiental
Abs
Ildeu

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From: rmtakata@xxx
To: icmoreira@xxx
Subject: RE: enquetes
Date: Mon, 22 Aug 2011 14:22:28 -0300

Prezado Prof. Dr. Ildeu Moreira,

Mais uma vez, muito obrigado.

Nas próximas edições há intenção de se incluir perguntas sobre Compreensão Pública de Ciências, como no SEI/NSF e Eurobarometer? (Na pesquisa realizada pela Fapesp em três grandes cidades paulistas, encontraram-se resultados interessantes: quanto maior a compreensão do entrevistado, menor o apoio incondicional às C&T: http://www.fapesp.br/indicadores2004/volume1/cap12_vol1.pdf.)

Cordialmente,

Roberto Takata

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Date: Mon, 22 Aug 2011 18:36:30 -0300
From: icmoreira@xxx
To: rmtakata@xxx
Subject: Re: RE: enquetes

Roberto

Discutimos isto bastante com a equipe que formulou o questionário (da qual participou tb o Martin Bauer que coordenou a pesquisa do Eurobarômetro por um tempo, além de colegas da Argentina e de outros grupos brasileiros) mas decidimos não fazê-lo. Eu particularmente sou crítico em relação algumas daquelas questões que estão mal formuladas ou que são até incorretas.
Abraço
Ildeu

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From: rmtakata@xxx
To: icmoreira@xxx
Subject: RE: enquetes
Date: Mon, 22 Aug 2011 20:41:39 -0300

Prezado Prof. Dr. Ildeu Moreira,

Muitíssimo obrigado pelos esclarecimentos.

Peço permissão para acrescentar esses esclarecimentos na postagem do meu blogue em que analiso parte do resultado da pesquisa.

Cordialmente,

Roberto Takata

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Date: Tue, 23 Aug 2011 01:03:01 -0300
From: icmoreira@xxx
To: rmtakata@xxx
Subject: Re: RE: enquetes

ok, Roberto.
Abraço
ildeu

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Acabei sem saber se manterão a regularidade de 4 anos entre as pesquisas. Mas tem pelo menos uma nova programada para algum momento futuro.

Escolha deles, mas eu acharia muito interessante a inclusão das perguntas sobre conhecimento. Mesmo que reformulassem as que parecessem inadequadas.

domingo, 21 de agosto de 2011

O brasileiro está mais interessado em Ciência e Tecnologia?

Em janeiro deste ano, quando o MCT (atual MCTI) anunciou o resultado da enquete "Percepção Pública da Ciência e Tecnologia no Brasil" realizada em 2010, anunciouenfatizou-se que o interesse do brasileiro em C&T cresceu em comparação com pesquisa realizada em 2006.

No relatório de 2010, é apresentado o seguinte quadro comparativo do interesse dos brasileiros sobre alguns temas (Fig. 1):
Figura 1. Quadro comparativo da evolução do interesse do brasileiro em diversos temas. Fonte: Percepção Pública de C&T no Brasil. 2010. MCT

É, aparentemente, um aumento generalizado do interesse do brasileiro em temas que vão da moda à religião, da política ao meio ambiente. Mas os que respondem "não tem interesse" variaram muito pouco - praticamente dentro da margem de erro de 2 pontos percentuais.

Na Fig. 2 é reproduzida outra figura do mesmo relatório de 2010 - somente com os resultados desse ano.
Figura 2. Interesse do brasileiro em diversos temas em 2010. Fonte:Percepção Pública de C&T no Brasil. 2010. MCT

Compare-se com o quadro equivalente do relatório de 2006 (Fig. 3).
Figura 3. Interesse do brasileiro em diversos temas em 2006. Fonte:Percepção Pública de C&T. 2006. MCT

Essa figura parece ser reveladora ao reproduzir a pergunta feita em 2006. Aparentemente o efeito interpretado como aumento do interesse do brasileiro nesse período de 4 anos é tão somente o efeito da codificação distinta da pergunta, na edição de 2010 foi apresentado, pelo jeito, quatro níveis de interesse, enquanto na de 2006 eram três níveis de interesse. Aí, o que era "pouco interesse" em 2006 foi dividido em dois níveis: "interessado" e "pouco interessado". Bem como o "muito interesse" de 2006, foi dividido em: "muito interessado" e "interessado".

Em tendo havido uma mudança na pergunta, a real comparação deveria ser como na Fig. 4.
Figura 4. Quadro comparativo da evolução do interesse do brasileiro em diversos temas.

Repare que se dividirmos a barra amarela ("interessado") para os dados de 2010 ao meio e adicionarmos cada parte para "muito interessado" e "pouco interessado", reconstituiremos um gráfico similar aos dados de 2006 (Fig. 5).

Figura 5. Quadro comparativo do interesse dos brasileiros - modificação da Fig. 4: metade de "interessado" de 2010 somado a "muito interessado" e outra metade a "pouco interessado".

Uma possibilidade de comparação entre os resultados é através do índice de interesse calculado na pesquisa de 2006: uma média ponderada de pontos (3 para "muito interesse", 2 para "pouco interesse" e 1 para "nenhum interesse"), normalizando para 3 (na codificação para 2010, o máximo seriam 4 pontos). A Fig. 6 apresenta o resultado.
Figura 6. Comparação dos índices de interesse do brasileiro para diferentes temas.

Provavelmente algum fator de correção seria necessário para compensar o efeito da recodificação. Mas isso só seria possível se pesquisas com as duas codificaçõesformulações fossem realizadas nas mesmas condições. Corrigindo, bastante arbitrariamente, com base no valor das somas dos índices de interesse, obtemos o resultado da Fig. 7.
Figura 7. Comparação dos índices de interesse do brasileiro para diferentes temas. Modificado da Fig. 6 aplicando-se fator de correção correspondente à razão das somas dos índices de interesses dos anos de 2006 e 2010. 2010* dados de 2010 com fator de correção.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Um presente de grego (chinês) para o sesquicentenário de Archie?

ResearchBlogging.orgEste ano completam-se 150 anos desde a primeira descrição científica de um dos fósseis mais iconônicos: Archaeopteryx lithographica - com suas características eminentemente reptilianas: cauda óssea, dentes e garras nos membros anteriores, mescladas com características eminentemente avianas: penas e asas.

Um artigo publicado na Nature que descreve o Xiaotingia zhengi foi apresentado como prova de que o Archie afinal não é uma ave (ponto de uma longa discussão no meio paleontológico, ainda que, pelo menos até hoje, minoritário).

O resumão da ópera é que o Xiaotingia é representado por mais um daqueles famosos fósseis de excelente preservação encontrado na China e tem uma cara genérica dos dinos emplumados que têm sido descritos desde 19991998 na região. Quando analisadas suas características anatômicas, junto com a de Archie e alguns outros dinos terópodos (88 no total se não contei errado), resultou em uma árvore filogenética em que Xiao arrasta Archie pra fora do grupo conhecido como Avialae (dentro do qual as aves modernas estão incluídas - nota-se que no estudo não foram incluídos representantes de aves atuais): mais especificamente, faz com que Archie esteja mais próximo de um Velociraptor do que de um Confuciusornis. Ao menos em uma das árvores - a que foi discutida mais detidamente no artigo.


Figura 1. Árvore filogenética proposta por Xu et al. 2011 conforme Witmer 2011.

Se esse resultado se confirmar (lembremos que no material suplementar outras ávores são apresentadas, em uma delas, Archie está bem empoleirado no grupo dos Aviale), poderemos dizer que Archie não é uma ave?

Hmmm, depende. Pode ser mais o caso de dizer que *Velociraptor* é uma ave. Ocorre que há uma divergência entre os especialistas sobre como definir Aviale ou mesmo Aves. A definição de Avialae usada por Xu e colaboradores foi: o grupo mais inclusivo contendo Passer domesticus, mas não Dromaeosaurus albertensis (que define o grupo dos Deinonychosauria) ou Troodon formosus (que define o grupo dos Troodontidae). Mas há definições que usam exatamente o Archie como ponteiro, como a de Sereno 2005 para Aves: grupo menos inclusivo contendo Archaeopteryx lithographica e Passer domesticus. (Para uma discussão sobre algumas das definições propostas, veja aqui; para uma pequena lista de definições propostas que obedecem às regras de monofiletismo, veja aqui.)

Adotando-se a proposta de Sereno 2005, *por definição* Archie é uma ave, e a mudança de sua posição na árvore apenas aumentaria ou restringiria (no caso deste estudo, aumentaria) a amplitude da definição.


Referências
Sereno, P. (2005). The Logical Basis of Phylogenetic Taxonomy Systematic Biology, 54 (4), 595-619 DOI: 10.1080/106351591007453

Xu X, You H, Du K, & Han F (2011). An Archaeopteryx-like theropod from China and the origin of Avialae. Nature, 475 (7357), 465-70 PMID: 21796204

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Resultado: Concurso Cultural "Dois Neurônios e Meio"

"Qual a estimativa do número médio de neurônios no cérebro humano?
Segundo artigo de 2009 do grupo de Roberto Lent e Suzana Herculano-Houzel, baseado no trabalho de mestrado de Francisco A. C. Azevedo."
Resposta: 80 a 90 milhõesbilhões*. Ou mais precisamente: 86,1 +/- 8,1 bilhões de neurônios.

"Em que cidade potiguar está sendo contruída a Escola Lygia Maria Rocha Leão Laporta?"

"O sequenciamento do genoma neandertal corrobora ou refuta a hipótese da equipe de Bruce Lahn sobre a evolução do cérebro e da inteligência humana?
Segundo os achados do trabalho da equipe de Svante Pääbo publicado em 2010 na Science."
Resposta: "Refuta, pois mostra que o haplótipo D do gene da microcefalina não está presente no genoma neandertal". (Comentei isso de passagem nesta postagem sobre o genoma neandertal.)

"Como se chama o comitê voluntário de notáveis idealizado e capitaneado por Miguel Nicolelis?
E que deve assessorar o Ministério de Ciências e Tecnologia."
Resposta: "Comissão do Futuro da Ciência Brasileira". Foi oficializada pela Portaria MCT nº 236, de 28.04.2011 e aqui tem a composição da primeira CFCB.

"Por que as crianças da escola de primária de Blackawton disseram que as abelhas parecem pensar?
Elas realizaram um trabalho com mamangabas sob orientação de Beau Lotto e publicaram os achados na Biology Letters em 2010."
Resposta: "Porque as abelhas foram capazes de identificar de modo plástico padrões de coloração distintas associando-os à presença ou não de alimentos". (Fiz uma postagem sobre o trabalho aqui no GR.)

Agradeço a todos os que participaram - seja respondendo, seja indicando a promoção.

*Upideite(05/jul/2011): Correção a esta data. Notado por @gmpassos.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Sing Along: The Rap Guide to Evolution


The Rap Guide to Evolution


Upideite(03/jul/2011): Nos comentários, Jeferson Arenzon, do Coletivo Ácido Acético, informa que eles fizeram uma tradução da participação de Brinkman no TEDXKids.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Divagação científica: divulgando ciências cientificamente - 16

Um dos campos da divulgação científica é o jornalismo científico; e algumas das questões relacionadas ao mapeamento do problema da divulgação científica são sobre os intermediários e os meios: o grau de acurácia, confiabilidade e preparação.

Dois artigos recentes analisam a confiabilidade de jornais em duas áreas: nutrição e meio ambiente.

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Cooper, B.J.E. et al. 2011. The quality of the evidence for dietary advice given in UK national newspapers. Public Understanding of Science 20(3). doi: 10.1177/0963662511401782. Comentado por um dos autores.

Vestergård,G.L. 2011. From journal to headline: the accuracy of climate science news in Danish high quality newspapers. Journal of Science Communication 10(2). Disponível em: http://jcom.sissa.it/archive/10/02/Jcom1002%282011%29A03/
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O primeiro analisou alegações relacionadas à dieta publicadas durante uma semana nos 10 principais jornais do Reino Unido. 111 alegações foram consideradas. Dessas: 69 (62%) foram categorizadas como baseadas em indícios insuficientes, 11(10%) foram considerados como 'possíveis', 13(12%) como 'prováveis' e 17(15%) como 'convicentes' (isto é, com indícios bem estabelecidos).

O segundo estudou reportagens publicadas nos três principais jornais dinamarqueses no período de 1997 a 2009. Foram examinadas 88 notícias e classificadas de acordo com a acurácia em reproduzir elementos de artigos de revistas científicas (Nature e Science) citadas na matéria - de um total de 4.922 notícias publicadas no período mencionando mudanças climáticas. 46(52%) apresentaram algum grau de inexatidão: 16% apresentaram inexatidão fatual (como erro numérico ou de termos científicos), 11% apresentaram confusão de fonte (como considerar uma frase dita por um cientista em um release como sendo uma frase presente no artigo científico), 23% apresentaram omissões ou adições (inclusão de citações ausentes na frase original ou deixar de mencionar limitação de abrangência geográfica, p.e.), 7% exageros (como considerar somente o valor do extremo de uma faixa de incerteza), 2% paráfrases (usos equivocados de reconstruções de frases ou de eufemismos), 10% conclusões errôneas (como considerar uma projeção como um fato provado), 5% confusão generalizada (citação errônea que distorce completamente o fato científico).

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